Lendas
Escoteiras.
As fabulosas
aventuras de Tonico Caçarola.
Dizem que histórias são
histórias nada mais que histórias. Mas tem umas que a gente acredita, pois se
foi um Escoteiro quem contou merece credito. Melhor ainda se a gente estava lá
presente e não tem como duvidar. Muitos amigos quando conto a história de
Tonico Caçarola dão sorrisos e devem pensar: - Este cara sabe contar uma patacoada.
Mas eu juro pelo dente enorme do Pasqualino Monitor da Leão que ainda está vivo
que e que um raio caia sobre a cabeça de meu melhor leitor se não for verdade. Só
posso dizer que os patrulheiros da Patrulha Corvo riam atoa com Tonico
Caçarola.
Afinal acampar é bom demais e
comer bem melhor ainda. E eles comiam manjares dos deuses. Tonico Caçarola para
mim foi um dos maiores cozinheiros Escoteiros de todos os tempos. No campo a
turma ficava olhando de longe, pois ele não admitia que ninguém chegasse
proximo ao fogão para ver o que ele estava fazendo. E quando ele tocava o sino
(o danado tinha um) ninguém queria ficar para trás era uma corrida só. E olhe,
se você batia o garfo no prato estava condenado. Ia para o fim da fila e só
recebia metade da sua parte.
Moreno alto para os seus
catorze anos, ele penteava o cabelo no estilo de Elvis Presley. Sem uniforme a
gola da camisa era jogada para cima. Andava como se fosse passarinho, dando
pulinhos. O moço era jeitoso mesmo. Metido a bonito, falava compassado, tinha
uma voz grossa e sabia como utilizá-la para impressionar. Quem o via pela
primeira vez na cozinha de um acampamento ficava embasbacado. Usava um chapéu branco
enorme de cozinheiro, e mesmo grande nunca caia de sua cabeça. Uma jaqueta
branca tão alva que nunca ninguém a viu suja.
Colocava um lenço de seda amarrado
ao pescoço dando um ar diferente. Infelizmente não podia usar a calça azul dos
cozinheiros, pois era obrigado a usar a calça do uniforme e sabia que isto não
era roupa para cozinheiros. Quem não o conhecia diziam que era um “mascarado” e
só quer aparecer. O fogão de campo era de tirar o chapéu. Fazia questão de
separar as bocas e no fim do fogão sempre havia uma pequena chaminé. Ninguém
nunca viu a fumaça em seus olhos e ele estava sempre sério no preparo de suas
guloseimas.
Diziam que a moças da cidade andava
atrás dele como se fossem abelhas a procura do mel. Mas nem tudo que reluz é
ouro dizem por aí. Tonico Caçarola sofria do intestino e ele se maldizia por
ter aquela infelicidade. Se alguém chegasse para ele e dissesse: - E a barriga
Tonico, como vai? - Era a conta. Ele saia correndo a procurava de um banheiro e
se não encontrasse seus puns eram ouvidos longe. E o cheiro? Impossível de
ficar próximo.
Uma vez quando o Cinema
Palácios passava em sessão de gala os 10 Mandamentos alguém gritou alto: - E a
Barriga Tonico, como vai? Foi à conta e ele teve um ataque. Ninguém ficou para
ver o final do filme. Para desinfetar o cinema foi preciso trabalhar uma
semana. Mas Tonico era demais. Fazia um forno de barro no campo que todos
invejavam. No aniversário da tropa fez questão de fazer um Leitão a Pururuca e
a fila que se formou era enorme. E olhe, acompanhada por três travessas de
feijão tropeiro e muitos queriam saber o segredo do torresmo tão bem preparado.
A Patrulha Corvo era uma
privilegiada. Todos queriam ser da patrulha, mas quem saia? Ninguém. – Foi em
um sábado chuvoso que o Chefe Dentinho comentou que a tropa na semana seguinte
ia receber seis meninas, que agora poderia ser escoteiras. A tropa ficou em
polvorosa. Tonico Caçarola ficou um dia passando seu uniforme. Um brinco. O
lenço parecia uma gravata de tão bem passado. E o chapéu? Deus do céu, Abas
retas que nem a Policia Montada. A fivela do cinto parecia de ouro de tão
brilhante que doía os olhos ao olhar.
– Sábado, dia da apresentação.
O Chefe vendo que Tonico Caçarola estava muito bem uniformizado, o convidou
para receber as meninas em nome de todos os Escoteiros. Um sorriso de ponta a
ponta. Bandeira, hino Nacional, as meninas curiosas com tudo. Hora de dar as
boas vindas. Tonico Caçarola se dirigiu a todas que estavam formadas em linha. Fazendo
uma pose de John Wayne, celebre ator de faroeste de Hollywood, levantou a mão
esquerda, mostrou como se entrelaçava e esquerdamente cumprimentou uma a uma.
Até hoje ninguém sabe quem foi,
mas alguém gritou! – “E a barriga Tonico, como vai”? – Todos já sabiam o que ia
acontecer e não ficou um na ferradura. Tonico Caçarola corria desembestado
procurando uma privada e dando puns para todo o lado. As meninas ficaram
amarelas com o mau cheiro e saíram correndo da sede. O Chefe queria matar quem
gritou. Sei que por muitos anos nenhuma menina quis ser Escoteira naquela
tropa. Mas o danado de Tonico Caçarola com suas guloseimas faziam todos
esquecerem suas prontas investidas no ar respirável.
Sei que muitos anos depois
eu e a Celia resolvemos jantar no Makano, um restaurante famoso em São Paulo e
eis que para nossa surpresa o Maitre era nada mais nada menos que Tonico
Caçarola. Bem agora ele pomposamente se intitulava Anthony Bassolet o chef.
Quando o vi acenei e ele me reconheceu. Veio sorrindo com a pose é claro de
grande chef. Seu estilo de andar e falar nunca foi abandonado. Levantei e
apresentei a Célia a ele. A desgraça aconteceu. Meu Deus! Porque fui dizer
aquilo? Foi sem querer ou foi maldade pura? Desgraçadamente depois do abraço eu
perguntei: – “E a barriga Tonico, como vai” – Incrível! Era como se um fedor
dos infernos caísse do céu no restaurante.
Os puns de Tonico ribombavam
como se fossem trovões nas noites de acampamentos. As Socialites, os novos
ricos os políticos famosos que naquele dia jantavam corriam como se fossem leopardos
em busca da caça. Eu mesmo peguei na mão da Célia e vendo a desgraça que tinha
cometido saí correndo feito uma lebre e olhe nunca mais voltei no Makano. Sei
que tudo foi apagado da imprensa. Afinal os donos eram sobejamente conhecidos
da sociedade local e internacional. Ninguém nunca disse nada, mas sei e posso
jurar que Tonico Caçarola foi para a Espanha. É maitre de um famoso restaurante
em Valença. Só peço a Deus que nunca e em tempo algum vá aparecer alguém e
perguntar em alto e bom som:
- E a barriga Tonico,
como vai?
Nota - Contam por aí
que Tonico Caçarola é Chief do Restaurante Botafumeiro em Barcelona. Um dos tops
10 da Espanha. Proibiu a entrada de escoteiros brasileiros que conheciam sua
fama. Anda com uma borduna de lado e quando vê alguém e desconfia que poderia
ser do seu grupo ou distrito, chama o segurança e ambos o põem para fora. E aí
Tonico, onde anda a fraternidade? Ele olha com ódio, pois não pode nem ouvir
até hoje: - “E a barriga Tonico, como vai”?
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