domingo, 21 de maio de 2017

Topázio.


Lendas Escoteiras.
Topázio.

             O trem noturno deslizava lentamente pelas montanhas e vales do Rio das Sombras. Topázio de olhos fechados não dormia. Nem apreciava a paisagem que descortinava pela janela escura sem lua e com milhares de estrelas brilhantes no céu. Desistira de pensar e de sonhar. Uma vida que nunca deu valor. Vivia por viver e nada mais. O que poderia esperar? Acreditar nestas velhas frases de autoajuda que devemos tentar sempre e não desistir? Um dia ele sonhou acreditou mesmo que teria o que queria e que sempre pensou em ter. Uma família, uma mulher amada, filhos um trabalho honesto. Onde ficaram seus sonhos? Qual estrada não tinha a ponte para ligar o sonho à realidade?

             Um som inaudível veio através da janela do vagão de segunda classe. Sentiu que o trem se aproximava de uma estação. Quem poderia cantar tão harmoniosamente naquele fim de mundo? Bem que o trem fizesse o que deveria fazer. Recolher aqui e ali os viajantes sem destino ou com passagem só de ida. Quando o trem parou viu que o cantarolar era de uma jovem com uma voz maravilhosa. Seus olhos e ouvidos ficaram alerta para tentar saber quem era a jovem que atraiu sua curiosidade. Na estação uma luz bruxuleante pouco dava para ver além de sua imaginação. O ruído incessante das caldeiras era como um aviso que a qualquer hora o trem iria partir.

              Um zum, zum e um roçar de pano com bastões vermelhos deixou ver meninos e meninas entrando no seu vagão de segunda classe. Foi um susto, sentiu um calafrio na espinha... Os sentimentos do passado se transformam em emoções de um tempo que já passou. Ele sabia que lembrar iria surgir uma pequena luz de felicidade em sua vida. Sorriu para si mesmo ao ver que eram escoteiros. Quanto tempo! Tempo demais para reviver. Tinha saudades? Ele nem sabia mais. Tinha se esquecido de tudo e sabia que sempre tentou afastar de sua mente a alegria de um passado distante sem volta sem retorno. Todo mundo deveria ter uma lembrança verdadeira que deveria durar até o fim de sua vida. O escotismo foi um acontecimento que ele nunca deveria esquecer.

               Quantos eram? Onze? Doze? Pode ser. Algumas meninas sorridentes. Qual delas cantava como um Uirapuru nas noites de luar? Olhou disfarçadamente para todas elas. Belas, meninas moças que aprendiam a vida na sua melhor forma com a natureza. Elas e eles garbosos, chapelões, mochilas esverdeadas, bastões pintados de vermelho e sorrisos em profusões. Ele sabia que nem todo mundo que chegou em sua vida iria ficar para sempre. O escotismo teve seu auge, seu momento e fora um passado que quase esqueceu. Fechou os olhos e pensou que não queria machucar duas vezes. Cada um educadamente sentou em um banco de madeira conversando alegremente sem incomodar os demais.

                Tentou dormir e afastar as belas lembranças dos campos floridos, dos vales escondidos entre montanhas envergonhadas querendo esconder tudo de tão belo que possuíam. Quantos acampamentos, quantas aventuras. Deus! Preciso afastar de mim este belo momento nunca vai me fazer diminuir o que sempre senti naquela ocasião. Eis que a menina escoteira finalmente se revelou, tinha um pequeno banjo e com ele fez o arranjo mais bonito que já ouvi. Ah o amor... Que nasce não sei aonde, vem não sei como e dói não sei por quê. Mas seus versos não eram assim. Falavam de coisas lindas que só os escoteiros sabem cantar...

              O tempo foi passando, o burilar de uma saudade corria como serpentes entre o rio das sombras e os vagões cinzentos cheios de gente procurando chegar ao seu destino. Ele semicerrou os olhos para fingir que não via o seu passado. Jovens amantes da aventura, dos sonhos dourados, das canções em noites de luar... Sabia que devia aproveitar a companhia de quem trouxe belas recordações de seu passado que ainda não passou. Afinal nunca sabemos o quando podemos partir. Um apito, outra estação e o adeus chegava ao fim. Eles desceram, a mocinha escoteira do banjo cantou a ultima estrofe: - “Coisas impossíveis nunca irão existir. Melhor esquecê-las que desejá-las”.


               Um silêncio sepulcral. Seu passado chegou em forma de meninos e meninas Escoteiras e partiram como se o vento os levassem para onde ele não podia mais ver. Olhou de novo pela janela. Ele sabia que se um poeta consegue expressar a sua infelicidade com toda a felicidade, como é que ele poderia ser infeliz? Afinal a vida é muito curta prá ser pequena. Uma resolução foi tomada. Partir para outra. Levantar, seguir o sinal de pista até que encontre o fim de pista. E se o encontra-se veria próximo o voltei ao ponto de reunião. Adeus passado, bem vindo futuro. Se for para recomeçar chegou a hora. E ele sabia que sua hora tinha chegado.

 “Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói, e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer”. Um antigo escoteiro que não teve escolha a não ser voltar no tempo e ver que tudo que foi sempre será!

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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