quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Contos de natal. O feliz natal da Família Borelli.


Contos de natal.
O feliz natal da Família Borelli.

                   Quantos anos ele estava naquela vida? Dois? Cinco? Dez anos? Ele não sabia mais. O tempo não importava. Aprendeu a viver com a luz do dia e o brilho das estrelas a noite. Comia dia sim dia não. Seu corpo era um trapo jogado nas sombras de um viaduto naquela grande cidade. Na Padaria do Seu Matheus sempre conseguia um pão para comer. Sua barba cresceu enormemente. Vez ou outra quando chovia ficava em seu calção velho e desbotado e gargalhava com a cascata que brotava de cima do viaduto. Era seu banho mensal ou anual... Não lembrava seu nome. O chamavam de Jesus. Porque nunca soube. Francamente ele nem se lembrava de quem foi Jesus. Apanhou muito e até tentaram fazer dele uma tocha para alegrar uma rapaziada que sentia prazer assim.

                    Esqueceu-se de como chorar ainda bem que sabia sorrir. Sua pele agora escura pela sujeira e o tempo no sol nada dizia de seu passado. Um dia vários meninos de uniforme e chapelão pararam a sua frente no Viaduto Santa Efigênia. – Moço! Queremos ajudar o senhor! Ele olhou aqueles pivetinhos empertigados na sua apresentação. – Me ajudar? Sorriu. Era bom sorrir principalmente para meninos que ele tinha na lembrança que um dia conheceu um. – Moço, hoje é dia da nossa boa ação de Patrulha. Queremos ajudar. O Chefe nos deu a chave da sede. Se o Senhor quiser poderá tomar um banho e vamos servi-lo com um lanche que compramos com a nossa mesada. Iremos dar ao senhor varias roupas usadas para trocar por esta.

                   - Porque não? Pensou. Nem lembrava mais quando tomou um banho de sabonete. Uma toalha limpa, uma mesa para almoçar um pedaço de Peru que a mãe de um deles fez para ele. – Moço, porque não dorme aqui na sede hoje e amanhã fica para a reunião? – Ele olhou para aquele menino que fazia um convite que há muitos anos não recebia. Dormiu em um colchonete e nem reclamou do frio do pátio iluminado. Sentiu-se um rei. Era bom demais. As pedras jogadas, os chutes da rapaziada, o frio e a chuva que recebia embaixo do viaduto não aconteceu. Não sabia por que aqueles meninos o tratavam com tanto carinho. Acordou com um canto de pardais que pensou ter voltado no tempo. Havia um bosque próximo ao salão da sede. Deu uma volta e uma angustia enorme percorreu todo seu ser. O que seria?

                Viu a algazarra dos meninos chegando. Eram azuis, outros de chapelão e adultos que ele olhou de soslaio com medo de ser expulso. Sentiu um calafrio com o grito de vários meninos, uma lágrima rolou quando viu a bandeira subindo aos céus. O corre-corre, os pequeninos gritando lobo, o jogo do quebra queixo havia alguma coisa no ar que ele conhecia. Um Velho de calças curtas se aproximou dele. Um semblante simpático e amigo. – Olá! Como vai? – O que dizer para ele? A vida dele era assim, chutado e escorraçado e agora alguém perguntava se ele ia bem? – O velho chegou mais perto. Olhou seus olhos, tampou sua barba embranquecida, chamou outro Chefe e falou baixinho em seu ouvido sem ele nada ouvir.

                Vieram outros adultos, começaram a fazer perguntas. – O chamavam de Tiago, da cidade de Ouro Negro. Ele tinha relances, mas logo sua mente escurecia e ele não se lembrava de nada. O Velho sorrindo disse para ele ficar a vontade. Agora a sede dos escoteiros era seu lar. Ele poderia ficar tranquilo, estava no meio de amigos. Telefones voavam como vento de outono para Ouro Negro. Um corre, corre em pleno sábado véspera de natal. Vários automóveis pararam em frente à sede e uma senhora desceu de um veículo correndo até a sede. – Onde ele está? Meu Deus! Tem de ser ele. Quando o viu não teve dúvidas. O abraçou chorando. Vários outros também o abraçaram. – Papai! Papai! Ele espantando não sabia o que dizer. Todos choravam não de tristeza, mas de alegria!

Prologo:
- Em Ouro Negro Tiago Bernabeu dos Santos era amado e respeitado. Com 32 anos era um Chefe Escoteiro que todos admiravam. Casou com Nora Amâncio filha do senhor José Silva Amâncio um próspero fazendeiro que o adotou como filho. Tiago era de linhagem simples, funcionário da Fábrica Alvarez. Ele e Nora tiveram quatro filhos uma menina e três meninos. Casou em 1966 e já tinham passado mais de 15 anos desde que ele desapareceu. Tudo aconteceu quando ele e mais seis pioneiros resolveram escalar a Serra dos Andradas. Ele escorregou em um penhasco e apesar das buscas por mais de cinco meses seu corpo nunca foi encontrado. O Grupo Escoteiro de Ouro Negro nunca o esqueceu. De histórias encheram-se as paginas dos livros de atas e afins.


- Ele aos poucos tinha lampejos de lembranças e isto o fazia feliz. Conta à lenda que Tiago ficou ainda muitos anos sem memória e aos poucos ela foi retornando. Viveu feliz com sua família até o final de sua vida. Nunca pensou que a felicidade pudesse ser duradoura. A vida que ficou para trás nunca foi motivo de vergonha ou mesmo de arrependimentos. Foi um aprendizado para seu crescimento espiritual. Naquele ano de retorno, a família e ele abraçados, foram participar da Missa do Galo. Tiago chorou. De alegria. Pensou que se não tivesse sido Escoteiro não teria um final feliz. Olhando Jesus na manjedoura se lembrou de seu passado. Era como tudo estivesse guardado e voltado para que ele pudesse de novo renascer!       

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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