sábado, 31 de dezembro de 2016

Saber ouvir quase que é responder.


Crônicas de um Chefe Sênior.
Saber ouvir quase que é responder.

             - Ele me procurou naquele sábado de 31 de dezembro. Preparava-me para partir, pois minha família já estava no interior em casa de parentes. Ia passar a virada de ano com eles – Olá Chefe. Atrapalho? – Joshua, sempre ele. – Entre meu amigo. Ele entrou de cabeça baixa como não querendo dizer nada. No meio da sala deu meia volta. – Outro dia volto Chefe. – Joshua se veio até aqui diga logo o que deseja meu amigo. – Ele me olhou com aquela cara de magoado com o mundo. Quer ouvir? Perguntou-me. Fiquei calado. Aprendi com Sócrates que um Chefe Sênior deve ter quatro características para liderar uma Tropa Sênior e Guias: Escutar com cortesia, responder sabiamente, ponderar com prudência e decidir imparcialmente.

              Joshua era inconstante. Há meses me procurou dizendo que ia sair do escotismo. – Chefe ser Sênior para mim não dá. Até que ser Escoteiro foi bom. Quando tentei argumentar ele me olhou com aquele ar de enfado: - Chefe precisa aprender a ouvir! – Me lembrei de que voltou um mês depois como se nada tivesse acontecido. – Sentamos na poltrona da sala e fiquei ali calado. Ele também. Minutos depois disse: - Ela me trocou por outro Chefe. – Devia ser sua nova namorada. Não a conhecia. – O que devo fazer? – Quer respostas Joshua? – Ele balançou a cabeça negativamente. – Quero desabafar Chefe, só isto. O senhor já me disse que a vida pode nos derrubar, mas somos nós quem escolhemos a hora de se levantar. – Me levantei chegando perto dele: - Joshua, as montanhas da vida não existem apenas para que você chegue ao topo, mas para que você aprenda o valor da escalada. Dê tempo ao tempo. O mundo continuará girando queira você ou não.  

             Notei lágrimas em seus olhos. – Continuei – Na vida Joshua você irá encontrar três tipos de pessoas, aquelas que irão mudar a sua vida, aquelas que irão prejudicar a sua vida, aquelas que serão a sua vida. Levante a cabeça, não corra atrás de um alguém que demonstra viver bem sem você. Deus sabe quem colocar na sua vida, da mesma forma que sabe quem tirar. Não corra atrás de um alguém que demonstra viver bem sem você. – Ele se levantou, não chorava mais. – Boas festas Chefe! E saiu sem ao menos me dizer até logo ou me dar à mão esquerda o que fazíamos nos seniores questão de honra.

             Um ano depois ele foi estudar na capital. Voltou após cinco anos homem feito e bateu na porta de minha casa: - Chefe passei só para lhe dar um aperto de mão. Junto a ele uma moça linda de cabelos negros encaracolados. – Minha Esposa Chefe. Prometo que seremos felizes para sempre como o Senhor e sua Esposa. Formei-me em psicologia. Estou indo para Pedra Azul onde vou abrir um Consultório. Vá me visitar!  


            Quem diria! A vida da muitas voltas e o mundo nos reserva surpresas mil. Gosto muito de falar, mas adoro ouvir. Eu sei que uma maneira de agradar é deixar que cada um fale por si. Pois é, como disse aquele sábio, a natureza deu-nos duas orelhas e uma só boca para nos advertir de que se impõe mais ouvir do que falar!

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

“Corisco”


Lendas Escoteiras.
“Corisco”

            - “Filho”, o Corisco agora é seu! – Quase pulei no pescoço de papai de tanta alegria. Amava Corisco, ele era meu único amigo no sítio onde morávamos. Conversava com ele e muitas vezes me levou para as reuniões de minha Tropa escoteira na cidade. Não era longe, menos de cinco quilômetros – Mas você sabe, disse papai, Corisco já tem mais de 30 anos. Não vai viver muito. Portanto não force quando montá-lo. – Naquela noite pedi para Deus que não o levasse tão cedo. Depois rezei para minha mãe que jazia na cama sem poder andar. Conversava sorria me animava, mas não fazia mais nada. Eu era o homem da casa com meus doze anos. Tornei-me cozinheiro, lavava, passava fazia de tudo e Dona Rita uma vizinha vinha uma vez por semana para ajudar. Papai quando chegava da lida dava banho nela, e ficavam horas conversando. Um amor de verdade!

                Nós tínhamos uma roça de milho, de feijão e outra de arroz. Dava para o sustento e meu pai aceitava convites para trabalhar nas fazendas próximas. Era um ótimo vaqueiro e tirava de letra qualquer tipo de plantação. Naquele sábado me aprontei para ir à reunião de minha patrulha e de minha tropa. Todos os sábados papai sempre chegava antes do meio dia e eu almoçava e saia a pé. Agora com corisco mesmo não correndo seria mais rápido. Passei a semana sonhando com meu Cordão Dourado que iria receber naquele dia. Até imaginava na ferradura todos com a palma escoteira e a patrulha dando o nosso grito. Deu uma hora e papai não chegou. Fiquei preocupado. Nunca deixaria minha mãe sozinha. Se ela soubesse iria insistir para eu ir.

                   Pela manhã passei meu uniforme, limpei meu chapéu, poli minha fivela do cinto e engraxei meus sapatos pretos. Minha mãe levou um tombo na escada de nossa casa e ficou com a coluna fora do lugar. Médicos sempre dizendo que se operar ela voltaria ao normal. Papai a levou a capital, mas nenhum médico deu esperança. Um se ofereceu por alta quantia que seria impossível conseguir. Já haviam se passado um ano e quatro meses. Mamãe nunca reclamou. Sempre disposta na cadeira de rodas e fazia tudo que podia fazer. Eu sabia que naquele mês época da colheita papai iria colher um belo campo de arroz de feijão e as aboboras na beira do rio deram como nunca. A fartura chegou. Eu sabia que papai ia vender parte para ajuntar e levar minha mãe de novo ao especialista. Ele nunca desistia.

                   Nos meus treze anos sabia fazer de tudo. Fazia as refeições diárias, lavava e passava e nunca deixei a casa sem limpar. Durante a semana deixava a escola correndo para chegar antes de minha mãe ir para a cozinha. Papai insistia para ela não se esforçar. Nunca esqueci o dia que minha mãe caiu e desmaiou. Sozinha em casa só cheguei da escola duas horas depois. Caia uma chuvinha fina e a terra molhada ela nada podia fazer. Comecei a ficar preocupado. Quase duas horas quando vi papai apear do cavalo e me pedir desculpas. Sorri para ele. Era duas horas e a reunião iniciava às duas e meia. Dei nele um beijo no rosto, fui até o quarto e despedi da minha mãe. Montei em Corisco a principio sem correr. Falei para ele baixinho se aguentaria um pequeno galope. Dito e feito, na curva do redemoinho ele parou e ficou de joelhos nas quatro patas. Já tinha visto isto antes com umas vacas do Seu Nolasco. Sempre morriam depois.

                   Chorando sai correndo até a sede escoteira. A reunião já havia se iniciado. Contei tudo para o Chefe Jofre o que aconteceu. Ele bondosamente me disse para não desesperar. Para tudo tem uma solução. Chamou os monitores pedindo para pegarem no almoxarifado cordas, facões e forquilhas das barracas. Levou também uma lona de caminhão que quase não era usada. A principio não entendi por que. Saímos todos juntos até onde estava Corisco. Ele não perdeu tempo. Logo as patrulhas cortaram troncos de árvores pequenas e começaram a montar dois suportes que iria levantar o Corisco acima do chão. Depois ele iria se apoiar de leve até se firmar. Disse o Chefe que ele teria de ficar ali por dois dias e eu devia trazer capim e agua para ele. Um Escoteiro foi avisar papai. Quando ele chegou através de roldanas com as cordas Corisco já estava em pé. Papai me abraçou e disse que tudo daria certo. Ah! Papai, como você não existe.

                     Muitos escoteiros se ofereceram a ficar comigo até na segunda. Trouxeram barracas e me ajudaram muito. No segundo dia vi que Corisco queria se apoiar. Soltamo-lo aos poucos usando a corda da roldana. Ele se firmou e até relinchou, pois a posição que estava era desagradável. Soltamo-lo das amarras e fui devagar com ele para nosso sítio. Deixei-o em um piquete bem abastecido de capim braquiária. Um mês depois ele já pastava em outros piquetes. Nunca mais o montei, mas saiamos muito para passear. Eu sabia que um dia ele iria partir, mas sabia também que faria tudo por ele sobreviver as suas dificuldades de velhice. O escotismo me mostrou um novo caminho. O caminho da amizade do um por todos e todos por um. Nunca esqueci o Chefe Jofre que fez questão de me entregar meu Cordão ali mesmo onde tomávamos conta de Corisco.


                   Mamãe nunca voltou a andar. Papai nunca a deixou só. Eu era suas pernas e aquele faz tudo que um bom Escoteiro sempre é. Corisco dois anos depois morreu. O encontrei na Piquete Sul, mas agora deitado. Ali mesmo o enterramos. A Tropa fez questão de comparecer. Quando desceu para seu túmulo recebeu uma bela palma escoteira e um bravôo. Fui Escoteiro por muitos anos. Hoje estou na faculdade da capital. Fiz questão de escolher ser um Veterinário. Aprendi a amar os animais e serei por eles um eterno guardião. Todos os feriados prolongados e nas minhas férias vou correndo para meu lar no sítio que tanto amo. Aqui trabalho em uma farmácia e tenho grandes amigos. O escotismo agora é difícil, mas ao voltar para onde morei nunca deixei de visitar o Grupo Escoteiro onde sempre sou bem recebido.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Contos de Natal. Rosas e crisântemos para Luiza.


Contos de Natal.
Rosas e crisântemos para Luiza.

                  Era uma rotina. Sempre nas tardes de domingo Baltazar ia até a Capela do Sino e lá ficava até escurecer. Idade avançada sentia que a subida cada domingo ficava mais íngreme e pensava quando não conseguisse chegar mais lá. Já não rezava, disse para se mesmo que rezou tanto que nem sabe se estava vivo até hoje foi por causa da sua fé. Fé? Ele achava que tinha perdido. Dezesseis anos vivendo sozinho e remoendo seus erros que no passado cometeu. Os dias felizes que passou ao lado de Luiza naquela capela nunca foram esquecidos. Olhava o altar e a via tão bela no seu vestido de noiva e ele ao seu lado de uniforme Escoteiro sorrindo feito um amante apaixonado. Deus! Não posso voltar atrás? Se ela me deixou eu fui o culpado e me penitencio.

                  Descia e subia a trilha do morro do Sino quase de olhos fechados tantas e tantas vezes que se martirizava a relembrar os momentos felizes que estivera ao lado dela. Porque não cedi aos seus desejos? Maldizia-se a todo tempo em achar que a verdade era dele e de mais ninguém. Trinta anos juntos e ela não me entendia. Ou será que eu era que não entendia o que ela me pedia? – Baltazar! Ela sempre dizia seja Escoteiro, mas não esqueça que estou ao seu lado. Amo você e não quero perdê-lo. Você não me dá mais atenção e vive para seus escoteiros. Ele olhava para ela como se ela não fosse sua companheira de tantos anos. Quando Noel nasceu ela achou que ele iria dar mais atenção a casa. Engano. Continuou o mesmo, acampando indo a Jamborees distantes, Camporees, encontros internacionais e gastando o que não tinha.

                   Foi um baque quando viu que Noel já crescido não quis ser Lobinho e depois Escoteiro. Mas eu o incentivei tanto! – Pensava que Luiza o induzia a não participar para não ficar como ele que não dava atenção a sua família. Trinta anos, e ele parou de ouvir Luiza e seus lamentos como sempre dizia. Não bastava dizer que a amava? Que ela era tudo para ele, mas o escotismo vinha em primeiro lugar. Seus amigos tentaram mostrar que ele não estava no bom caminho. Nada. Luiza passou a não comentar mais. Ele achou que agora sim seriam o casal que sempre sonhara ser. Quando ele voltou de um acampamento Nacional no Sul, queria encontrá-la e contar à felicidade que teve, as amizades que fez e o presente que trouxera para ela. Uma blusa de lã não tão cara, mas pensou que ela ia gostar.

                   Ela não estava. Um bilhete dizia que foi embora e nunca mais ia voltar. Não disse para onde e levou Noel consigo. Turrão disse para si mesmo: - Que seja prefiro viver sozinho com meu escotismo que ter alguém ao meu lado que não sabe me fazer feliz. O tempo passou um dois três trinta anos sem ela. Envelheceu. Não era fácil viver sozinho. Achou que ia acostumar e a cada dia, a cada ano mais sofria com a sua falta. Dona Norma cozinhava e lavava para ele. Podia pagar apesar de que cada dia o dinheiro rareava no seu consultório. Ninguem queria um médico que não tinha horário para atendê-los.

                  Foi Tomázio Chefe Sênior quem contou que a viu em Pedra Azul uma cidade do outro lado do mundo onde morava. Matutou uma semana e sua lembrança não saia de sua memória. Pediu demissão ao Grupo Escoteiro e partiu atrás dela. Todos estranharam, pois ele criou, manteve e levou o grupo sozinho. Nunca dividiu responsabilidades. Aceitava sugestões, mas a dele prevalecia no final. Muitos que entraram no grupo saiam em pouco tempo, mas ele teve aqueles mais fieis que nunca o abandonaram. – Elejam um novo líder para vocês! – Eleger? Eles não fazia ideia de como seria. Mais de 65 anos com ele na frente de tudo.

                 Quando partiu poucos foram despedir na rodoviária. – Não volto mais, disse. Em Pedra Azul ficou seis dias procurando e no dia 24 de dezembro soube que ela estava internada em uma casa de repouso na saída da cidade. Encontrou. Ela sorriu. Seus olhos encheram-se de lágrimas. A mulher da minha vida e eu não soube valorizar. Ajoelhou-se aos seus pés e chorando pediu perdão. Reconciliaram. Ela tinha perdido a visão e uma das pernas devido à tuberculose avançada. Ele dou boa parte do que tinha para a Instituição que a acolheu. Viveu com ela até o último dos seus dias. Soube que Noel fora para os Estados Unidos e se tornara um cirurgião famoso. Dizem que tentou encontrá-la e não conseguiu.


                  No dia 24 de dezembro dois anos depois, foram encontrados mortos no quarto que moravam. Ambos sorriam e estavam abraçados como dois amantes apaixonados. Antes de sua morte mandou construir um Mausoléu simples onde mandou plantar muitas rosas e crisântemos pois eram as flores preferidas dela. – Uma placa de bronze dizia: - Ela o perdoou. Agora vivem felizes para sempre no céu!

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Bandeiras ao vento!


Lendas Escoteiras.
Bandeiras ao vento!

                           O topo da montanha do Guairá estava longe, a Patrulha Kalapalo seguia a trilha dos seus antepassados. Todos sabiam que a Bandeira de Brás Esteves Leme havia passado por ali ha muitos e muitos anos. Brás era filho de outro sextanista e deu sua vida para achar as esmeraldas de Fernão Dias Paes Leme. Sertanejou na região limítrofe de Minas Gerais com São Paulo e antes de morrer nos anos de 1700 se estabeleceu em Pindamonhangaba. Tarântula um Sênior novato e estudioso foi quem sugeriu a caminhada. – Seria uma aventura e tanto seguir os passos de Brás Esteves Leme disse. Não iriam percorrer todo trecho, pois tinham pouco tempo. Máximo de quatro dias e meio aproveitando o feriado de Corpus Christi. Partiram a noitinha de quarta feira recebendo as bênçãos do Padre Ludovico.

                          Mesmo a noite com ventos calmos e frescos a subida era uma tortura. Eram seniores experimentados e em suas mochilas levavam só o essencial. Calmon o escriba de cabeça baixa pensava que maluquice fora esta de aprovar tal atividade. Jonathan o cozinheiro pensou em sugerir uma parada para fazer um chocolate quente. Para ele não tinha segredos um fogão estrela, um tropeiro ou mesmo um trincheira que dava trabalho, mas garantido de não espalhar pela floresta. Quintino o sub pensava o porque Valete o monitor ainda não deu a ordem de descansar. Isto nunca aconteceu. Sabiam que Valete era experiente, fora guia de Tropa e sempre sabia onde metia sua cumbuca em jornadas ou atividades aventureiras.

                          Com a brisa fresca a maioria dos seniores suava e até mesmo Donatela a única guia presente fazia tudo para não demonstrar que a caminhada estava sendo um suplicio. Ela sorria para si mesma a pensar nas grandes atividades que fizeram com os seniores. Tinha orgulho de pertencer a Patrulha Kalapalo. A trilha tinha ficado mais difícil a cada curva a cada passada. Cem duzentos metros se tornara um enorme sacrifício de percorrer. Algum aconteceu, pois Valete que ia a frente parou sem dizer nada. A patrulha o seguiu. Por alguns minutos só se ouvia os grilos da montanha e os pirilampos que rodeavam os seniores aventureiros.

                          - “uma fogueira há cem metros” Valete disse baixinho no ouvido de Donatela que vinha logo atrás. Ela treinada para os grandes jogos noturnos que faziam na Tropa Sênior, repetiu para Jonathan que fez o mesmo com Quinino e este a Calmon. Tarântula sorria. Quem sabe vamos filar um cafezinho quente? Foi então que um vozeirão repicou naquela trilha da Montanha do Guairá. – Caolho! Os meninos chegaram! – O que faço com eles? – Caolho veio ver quem era os meninos.  – Nossa! São Escoteiros Tiro Certo. Os patrulheiros continuaram em silêncio. Correr era perder tempo. Só uma trilha e em curva dando facilidade para Tiro Certo acertar qualquer um. – Caolho olhava nos olhos de cada um e sentiu um arrepio na espinha, pois não demonstravam medo.

                            Tirou de sua cintura um facão cuja lâmina brilhou ao luar. Tiro Certo sorria maliciosamente. – Vamos disse Calmon. Está no Tropeiro duas juntas de javali que matamos hoje. Podem comer a vontade! E deu uma enorme gargalhada. Jonathan respirou aliviado. Tiro Certo chegou próximo a Donatela que não demonstrou ter medo dele. Foram até o acampamento e viram só os dois bandidos. Tiro certo era baixinho, com um bigodinho preto e Caolho era enorme com uma venda preta no olho esquerdo. Os seniores sentaram-se em volta do fogo. Jonathan o cozinheiro tirou uma lasca da carne que estava assando. Ainda pingava sangue. Comeu e balançou a cabeça. Todos sabiam que poderiam comer sem problema.

                            - Eu também fui Escoteiro disse Caolho. Calmon quase riu da mentira, mas viu que era melhor ficar sério.  Tarântula perguntou onde. – Dois meses em Capiacanga. A carne mal passada do javali tinha um cheiro horrível, mas estava gostosa. Caolho se levantou cortou um pedado do sisal que tinha na sua mochila e começou a fazer nós. Todos olhavam embasbacados. Era um perito na arte de nós. Valete se levantou e nem olhou para Caolho e Tiro Certo. – Está na hora disse. Vamos em frente. Deu a mão esquerda para Caolho que ficou sem saber o que fazer. Todos viram que ele nunca fora Escoteiro. Levantaram-se deram o grito de patrulha e partiram. Tiro Certo e Caolho estavam espantados com tamanha coragem e nada disseram.

                           O cansaço da subida desapareceu. Se ouve medo ele também seguiu a lua que agora se punha no horizonte. Duas horas depois pararam. Eram três da manhã. – Vamos dormir um pouco. Amanhã partimos ao nascer do sol disse Valete. Dormiram e dividiram o tempo de sentinela. Quintino de olhos no céu começou a contar estrelas. Dormiu antes das duzentas. Calmon rezou uma pequena oração. Todos em silêncio acompanharam sua fala. Tarântula imaginava como devia ser a vida de bandoleiros. Jonathan repetia para si mesmo: Quem ousa conquista e saiu para a luta, irá chegar mais longe. Donatela atualizou em segundos o que passaram e dormiu em seguida. Valete dormia o sono dos juntos. Sua experiência para enfrentar as adversidades era conhecida.


                           No retorno da Montanha do Guairá, cinco seniores e uma guia cantavam na descida. Mais um tempo juntos. Quantos teriam pela frente não sabiam. Mas isto pouco importa, tinham como lema uma frase que Donatela quando saiu da Tropa das Escoteiras ensinou a cada um deles: - Não desista, vá em frente. Sempre há uma chance de você tropeçar em algo maravilhoso. Nunca ouvi falar em ninguém que tivesse tropeçado em algo enquanto estava sentado ou dormindo. É como dizem os seniores do mundo? - O futuro é nosso, vamos prosseguir. Vemos longe a brilhar a nossa estrela Dalva. Quando se é jovem não se pode desistir Marchar avante, e sempre avante, por sobre a terra, sobre os ares e pelo ar continuando se os outros param Sorrindo sempre! 

sábado, 24 de dezembro de 2016

Contos de Natal. O voo 678 do Comandante Escoteiro Noel.


Contos de Natal.
O voo 678 do Comandante Escoteiro Noel.

              Sempre fora seu sonho. Desde Lobinho quando fraturou uma perna pulando de uma árvore com um guarda chuva de seu pai. Como Escoteiro tirou todas as especialidades de aviador e aeronauta. Foi nos seniores que começou sua iniciação como futuro piloto. Sonhava em ser um piloto dos grandes aviões e isto lhe deu forças para um dia chegar como comandante de um belíssimo Airbus A330 avaliado em mais de cento e sessenta milhões de dólares. Foi uma longa jornada. Curso de piloto, treinamento intensivo, estágios e como Copiloto transportando milhares de passageiros. Sempre foi um escoteiro obediente e disciplinado.

              Ao tomar o assento para o início da sequência de tarefas, lembrou-se dos seus acampamentos quando nunca deixou ninguém a deriva. Mesmo quando teve de diminuir o ritmo de suas atividades Escoteiras devido aos estudos e os cursos que fazia sempre estava com eles. Seu Copiloto e amigo também foi Escoteiro um dia. Vitório era como ele e ambos sonhavam em pilotar gigantescas aeronaves pelos céus do mundo. Componentes ligados, computadores, rota de voo, ajustes e aguardar o embarque dos passageiros para partir. Fez questão de cumprimentar pelo fone a todos com simpatia. – Senhoras e Senhores passageiros, bem vindos ao voo 678 partindo do Aeroporto de Guarulhos com destino ao Aeroporto de Manaus... Nada tinha mudado e ele como disciplinado que era completou as normas de aviação aos passageiros finalizado que desejava a todos um Feliz Natal.

                    Noel sorria quando após o ultimo vetor do radar do controle de aproximação realizado, ele manobrou o belo avião rumo à pista de pouso. Estendido os flaps e os slats levantaram voo há uma velocidade aproximada de 907 km/h. Noel sabia que em menos de três horas estariam pousando no aeroporto Internacional de Manaus. Seu coração batia e pulsava de alegria. O A330 obedecia ao seu comando como um bom Lobinho obedece a sua Akelá. Belos tempos de outrora. O Grande Uivo, os acantonamentos e a primeira noite na barraca. Fora demais. O A330 parecia ter sido feito para Noel. O piloto automático, uma breve relaxada e uma volta junto aos passageiros. Nada como dar sempre alerta para saber quantos antigos escoteiros estavam embarcados. Quase quarenta de duzentos e dez passageiros responderam com o sinal escoteiro.

              Quando voltava para a cabine sentiu os primeiros tremores na aeronave. Sabia que estavam em uma turbulência de alto nível, pois o céu claro não podia indicar tal anormalidade. Noel não se preocupou, pois no seu treinamento como Copiloto passou por várias fases como esta. Tomou as rédeas de comando e acreditou que seria por pouco tempo. Lembrou-se da tempestade quando acampados na Serra Morena e raios pipocavam em todos os lugares. Não havia onde se esconder. Calmamente Noel conduziu toda a patrulha até uma parte mais alta do morro onde uma pedra enorme serviu de abrigo para a chuva torrencial e os raios. Em questão de minutos sairiam da turbulência e todos voltariam a sorrir novamente.

               O Velho mote que jamais uma turbulência derrubou um avião para ele era um mito. Ele sabia que isto podia acontecer. Afinal é como uma pipa de papel enfrenta um forte vento. Tranquilizou os passageiros e pediu as aeromoças alertarem a todos para o procedimento comum nestes casos. Sua tripulação tinha por ele o maior respeito. Foi em Camanducaia que descendo uma encosta com a patrulha o morro derreteu e todos foram levados montanha abaixo. Ninguém se machucou e aproveitaram para rezar. Ele católico fervoroso sempre fazia isto nas decolagens e aterrisagens. O avião sacolejava tanto que parecia um cavalo bravo tentando jogar seu cavaleiro para o chão.     

                 Tudo complicou quando o avião deu uma guinada de 45º e ele perdeu a direção do manche. Sua primeira viagem como comandante e tudo iria se perder? Lembrou-se de orar. Vitório tremendo o acompanhou. A nave balançava como uma pipa solta ao vento. Era como no acampamento em Verdes Mares quando a tempestade os pegou em cheio. Quatro patrulhas e ele sozinho na chefia. O que fazer? Chamou os monitores. Alguém tem ideia? Nonato sempre calmo disse que ficassem ali mesmo na encosta e se amarrassem uns aos outros. Assim foi feito o vento diminuiu e a tempestade passou. Noel não tremia, não tinha medo. Ele sabia que o final seria feliz. Era noite de 24 de dezembro e logo Jesus Cristo ia nascer.
              
                   Quando viu que a turbulência diminuiu e após receber o último vetor do radar do controle de aproximação, ele manobrou calmamente o seu A330 rumo à pista de pouso, estendeu os flaps e os slats e abaixou o trem de pouso. Cuidadosamente fez a última manobra para tocar o solo com suavidade. O Controlador da Torre informou que estavam autorizados a taxiar até o local designado. Motores desligados, missão cumprida. Embora alguns passageiros tivessem algumas escoriações o voo chegou a Manaus sem maiores contratempos. Noel se sentia aliviado. Foi como no dia que recebeu sua Insígnia de Madeira e viu que todos o ovacionavam. Assim os passageiros fizeram quando taxiou no aeroporto Internacional de Manaus.


                     Era como o fim de um acampamento e a alegria de ter participado. Fez questão de cumprimentar um por um todos os passageiros na descida do avião. O ultimo o abraçou. Obrigado Chefe. Eu sabia que estávamos em boas mãos. Um dia também fui um Chefe e aprendi que além de explorarmos o íntimo de cada jovem e descobrir sua personalidade, o senhor fez o mesmo com todos os passageiros. – Feliz natal chefe. Que todos que labutam no movimento Escoteiro saibam que os chefes sempre estão preparados para ajudar e fazer de tudo que possivel para trazer o sorriso e a felicidade. Até outra viagem Chefe! 


É NATAL!!!

Sim é natal, mais um entre muitos que tive a honra de ver e participar nestes anos que estou aqui na terra. Escondido em uma Belém longínqua o mundo mudou com sua vinda há mais de dois mil anos. Trouxe esperança, paz, amor e com sua sabedoria deixou um novo sonho que os homens aos poucos vão evoluindo e entendendo o que ele queria dizer. Que o Papai Noel que represento, fale em seu nome mesmo sabendo que Ele não me deu regalias para tal.
Amigos e amigas do Movimento Escoteiro, o bom seria se eu fosse um mágico e pudesse voar além das asas da minha imaginação e abraçar vocês pessoalmente. Falar baixinho em seu ouvido que somos todos irmãos. Dizer que seu sorriso encanta e que sua beleza está escondida no seu coração. Não tenho mágicas para realizar, nem mágico sou. Sou sim um Escoteiro de Corpo e Alma que aprendeu que a fraternidade não é só uma palavra, mas que depende de uma ação de todos nós.
Que os ventos do norte, do sul, do leste e do oeste não deixem apagar esta amizade que criamos e que elas se espalhem por todos aqueles que um dia adotaram Baden-Powell como exemplo no coração.
Dizem que quando é pra dar certo, até os ventos sopram a favor.
Feliz Natal! Doces pensamentos doces palavras e que aquele que nos trouxe a paz continue nos dando o amor para transmitirmos aos outros que precisam de nós!

Sempre Alerta!

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Contos de Natal. O último voo do Condor.


Contos de Natal.
O último voo do Condor.

                   Até hoje eu não sei explicar João Rosas e seus pássaros de ouro. Menino imberbe entrou na patrulha sem passar pelos lobinhos. Era tão magro que a escoteirada da Tropa tinha medo que em uma atividade qualquer ele fosse partir em vários pedaços. Isto não aconteceu. Dizem que se conhece qualquer Escoteiro em dois ou três de acampamento. Eu sempre acreditei nisto. Na sede nem sempre vemos se o Pata Tenra será futuramente um mateiro de envergadura e um bom explorador em suas jornadas. João Rosas era da Patrulha Javali e eu da Lobo. Sentia por ele uma amizade que nem sempre dedicava aos membros da patrulha. Foi no seu primeiro acampamento que tudo aconteceu. Logo que chegamos uma revoada de pardais se fez acontecer no campo de patrulha da Javali. Ninguem entendeu nada.

                  João Rosas era caladão, mas sempre com um sorriso nos lábios. Prestativo e educado. No seu primeiro acampamento foi empossado de bombeiro e lenhador, função que poucos gostam na patrulha. Os pardais se empoleiraram em um galho e um deles pousou no ombro de João Rosas. Ele sorriu e parecia falar com o pardal. A patrulha estupefata viu aquele idílio de um pássaro com um menino. Eles sabiam se aproximar dos animais e pássaros quando o vento estivesse a favor, mas pousar em um deles? Nunca viram isto. O Chefe foi chamado e sorriu ao ver uma nova amizade nascendo entre um passarinho e um Escoteiro. Isto foi só o começo. A cada dia aparecia um bando de andorinhas, ou sabiás e nem faltou os Canários Belgas que eram dono do lugar. Sempre o Chefe da passarinhada passando boa parte do dia nos ombros de João Rosas.

                 Lembro-me que tudo aconteceu no acampamento em Pedra Azul, duas semanas antes do natal para que fosse a despedida, pois logo entrariam em férias. Em Pedra Azul havia um montanha cuja lenda dizia que no ano de 1650 um Pirata chamado de Capitão Rockhpper enterrou um tesouro em uma gruta escondida na Serra do Condor com várias baús cheio de pedras preciosas, ouro diamantes e tantas pedras preciosas que até hoje ninguém sabe o seu valor. – A corte de Honra vibrou quando ele contou a historia e a lenda. – Não esperem encontrar nenhum tesouro, disse. Depois de tantos anos os saqueadores já devem ter levado tudo. Mas sabe como é, lendas de tesouros mapas e o escambal criam eternas fantasias nos jovens escoteiros.  Enquanto isto nas reuniões sempre uma revoada e um pássaro pousando no ombro de João Rosas.

                 Pedra Azul era um lugarejo de mais ou menos cinco mil almas. Todos vieram para as ruas para verem os escoteiros passarem. Calixto o Chefe quando via que não haveria perigo deixava todos andarem espalhados e ou em grupos ficando a critério da patrulha decidir. Zé Silvio foi quem cutucou a escoteirada logo que começaram a subir a montanha. Era um Condor dos Andes, daqueles que tinham a maior envergadura do mundo. Ele sabia que eram raros no Brasil e seu habitat eram nos Andes em altitudes superiores a três mil metros. Todos pararam para ver a ave que voava em circulo sobre as patrulhas. Esta era grande demais com mais de cem a cento e dez centímetros de envergadura. Zé Silvio leu muito sobre o Condor e sempre sonhara em conhecer e ou ver um.

                 Ficou por pouco tempo não sem antes dar um rasante em cima de João Rosas. Eles tinham pouco tempo para explorar. Sabiam que o tesouro não existia mais e sonhavam pelo menos encontrar a gruta. Passaram toda manhã se revezando em várias direções a procura da gruta. A tarde cansados encontraram um bom local para acampar. A noite ainda não tinha chegado e as Patrulhas Javali e lobo se confraternizavam em volta de um fogo esperando o cozinheiro anunciar o jantar. Uma revoada de mais de dez Condores sobrevoaram o campo de patrulha. Um deles desceu a toda velocidade e numa manobra incrível pegou João Rosas pelas garras e o levantou no ar, desaparecendo atrás da montanha.

                   João Rosas estava sumido a mais de cinco dias. Precisavam voltar para casa, mas sem João Rosas? Muitos choravam e sangravam as mãos e os pés vasculhando cada parte da montanha. Chefe Calixto estava desesperado. Como enfrentar a cidade e os pais de João Rosas? – Voltaremos com ele ou sem ele no dia 24 de dezembro. As buscas continuaram e sempre dando em nada. Foi pela manhã do dia 24 de dezembro que João rosas apareceu sorrindo no acampamento. No alto um rasante do Condor em cima dele e sumindo como se fosse um sol poente. Alegria geral. Trazia consigo um bornal cheio de pedras preciosas. – Chefe é para dividir com todos. – Mas você sabe onde está o tesouro? Perguntou Chefe Calixto. João Rosas sorriu e nunca contou para ninguém o que aconteceu com ele e sua espetacular viagem pelos ares com um Condor.

                     A cidade de Pedra Azul recebeu o maior fluxo de exploradores desde que a última noticia do tesouro se espalhou. Ninguém nunca achou nada. O Chefe Calixto e os escoteiros mesmo ficando ricos com o Tesouro não contaram para ninguém o que aconteceu. Até hoje em Vila Real sempre uma vez por mês um Condor sobrevoa a cidade e pousa na casa de João Rosas. Muitos disseram que ele sai a voar com seu amigo por lugares nunca antes imaginados. Se o Condor dos Andes voa solitário e habita as montanhas mais altas ele agora tem um amigo. Se eles se entendem ou conversam entre si, só as mais altas rochas das montanhas pode dizer se é verdade ou não. Ainda pretendo voltar em Vila Real. Quero rever agora na velhice João Rosas, pois sabia que ele nunca sonhou em voar longe do que amava!  


quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Contos de natal. O feliz natal da Família Borelli.


Contos de natal.
O feliz natal da Família Borelli.

                   Quantos anos ele estava naquela vida? Dois? Cinco? Dez anos? Ele não sabia mais. O tempo não importava. Aprendeu a viver com a luz do dia e o brilho das estrelas a noite. Comia dia sim dia não. Seu corpo era um trapo jogado nas sombras de um viaduto naquela grande cidade. Na Padaria do Seu Matheus sempre conseguia um pão para comer. Sua barba cresceu enormemente. Vez ou outra quando chovia ficava em seu calção velho e desbotado e gargalhava com a cascata que brotava de cima do viaduto. Era seu banho mensal ou anual... Não lembrava seu nome. O chamavam de Jesus. Porque nunca soube. Francamente ele nem se lembrava de quem foi Jesus. Apanhou muito e até tentaram fazer dele uma tocha para alegrar uma rapaziada que sentia prazer assim.

                    Esqueceu-se de como chorar ainda bem que sabia sorrir. Sua pele agora escura pela sujeira e o tempo no sol nada dizia de seu passado. Um dia vários meninos de uniforme e chapelão pararam a sua frente no Viaduto Santa Efigênia. – Moço! Queremos ajudar o senhor! Ele olhou aqueles pivetinhos empertigados na sua apresentação. – Me ajudar? Sorriu. Era bom sorrir principalmente para meninos que ele tinha na lembrança que um dia conheceu um. – Moço, hoje é dia da nossa boa ação de Patrulha. Queremos ajudar. O Chefe nos deu a chave da sede. Se o Senhor quiser poderá tomar um banho e vamos servi-lo com um lanche que compramos com a nossa mesada. Iremos dar ao senhor varias roupas usadas para trocar por esta.

                   - Porque não? Pensou. Nem lembrava mais quando tomou um banho de sabonete. Uma toalha limpa, uma mesa para almoçar um pedaço de Peru que a mãe de um deles fez para ele. – Moço, porque não dorme aqui na sede hoje e amanhã fica para a reunião? – Ele olhou para aquele menino que fazia um convite que há muitos anos não recebia. Dormiu em um colchonete e nem reclamou do frio do pátio iluminado. Sentiu-se um rei. Era bom demais. As pedras jogadas, os chutes da rapaziada, o frio e a chuva que recebia embaixo do viaduto não aconteceu. Não sabia por que aqueles meninos o tratavam com tanto carinho. Acordou com um canto de pardais que pensou ter voltado no tempo. Havia um bosque próximo ao salão da sede. Deu uma volta e uma angustia enorme percorreu todo seu ser. O que seria?

                Viu a algazarra dos meninos chegando. Eram azuis, outros de chapelão e adultos que ele olhou de soslaio com medo de ser expulso. Sentiu um calafrio com o grito de vários meninos, uma lágrima rolou quando viu a bandeira subindo aos céus. O corre-corre, os pequeninos gritando lobo, o jogo do quebra queixo havia alguma coisa no ar que ele conhecia. Um Velho de calças curtas se aproximou dele. Um semblante simpático e amigo. – Olá! Como vai? – O que dizer para ele? A vida dele era assim, chutado e escorraçado e agora alguém perguntava se ele ia bem? – O velho chegou mais perto. Olhou seus olhos, tampou sua barba embranquecida, chamou outro Chefe e falou baixinho em seu ouvido sem ele nada ouvir.

                Vieram outros adultos, começaram a fazer perguntas. – O chamavam de Tiago, da cidade de Ouro Negro. Ele tinha relances, mas logo sua mente escurecia e ele não se lembrava de nada. O Velho sorrindo disse para ele ficar a vontade. Agora a sede dos escoteiros era seu lar. Ele poderia ficar tranquilo, estava no meio de amigos. Telefones voavam como vento de outono para Ouro Negro. Um corre, corre em pleno sábado véspera de natal. Vários automóveis pararam em frente à sede e uma senhora desceu de um veículo correndo até a sede. – Onde ele está? Meu Deus! Tem de ser ele. Quando o viu não teve dúvidas. O abraçou chorando. Vários outros também o abraçaram. – Papai! Papai! Ele espantando não sabia o que dizer. Todos choravam não de tristeza, mas de alegria!

Prologo:
- Em Ouro Negro Tiago Bernabeu dos Santos era amado e respeitado. Com 32 anos era um Chefe Escoteiro que todos admiravam. Casou com Nora Amâncio filha do senhor José Silva Amâncio um próspero fazendeiro que o adotou como filho. Tiago era de linhagem simples, funcionário da Fábrica Alvarez. Ele e Nora tiveram quatro filhos uma menina e três meninos. Casou em 1966 e já tinham passado mais de 15 anos desde que ele desapareceu. Tudo aconteceu quando ele e mais seis pioneiros resolveram escalar a Serra dos Andradas. Ele escorregou em um penhasco e apesar das buscas por mais de cinco meses seu corpo nunca foi encontrado. O Grupo Escoteiro de Ouro Negro nunca o esqueceu. De histórias encheram-se as paginas dos livros de atas e afins.


- Ele aos poucos tinha lampejos de lembranças e isto o fazia feliz. Conta à lenda que Tiago ficou ainda muitos anos sem memória e aos poucos ela foi retornando. Viveu feliz com sua família até o final de sua vida. Nunca pensou que a felicidade pudesse ser duradoura. A vida que ficou para trás nunca foi motivo de vergonha ou mesmo de arrependimentos. Foi um aprendizado para seu crescimento espiritual. Naquele ano de retorno, a família e ele abraçados, foram participar da Missa do Galo. Tiago chorou. De alegria. Pensou que se não tivesse sido Escoteiro não teria um final feliz. Olhando Jesus na manjedoura se lembrou de seu passado. Era como tudo estivesse guardado e voltado para que ele pudesse de novo renascer!       

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Contos de Natal. Um certo curso de Gilwell.


Contos de Natal.
Um certo curso de Gilwell.

               Os alunos iam chegando cumprimentando e sorrindo. Julião um Velho Chefe Escoteiro o Diretor do Curso era muito conhecido em seu Estado. Idade avançada muitos haviam lhe aconselhado que desse folga a si mesmo. Chefe, estas atividades exigem muito esforço para que o curso fosse pródigo em dar o que todos precisam. Afinal ele sabia que o elixir do conhecimento era o que muitos desejavam. Seriam oito dias intensivos. Julião nunca abriu mão dos seus cursos que fossem cópias fieis ao programa editado em Gilwell Park. O presidente da Região e muitos membros formadores eram contra. - Porque só ele tem esse direito? Falar diretamente com ele ninguém tinha coragem. Afinal era um dos mais antigos formadores e só seu nome era motivo de centenas de inscritos o que dava sempre trabalho para escolha. Desta vez mais de 200 e no final foram separados os 32 primeiros inscritos.

                Julião gostava disto. Sentia-se de bem com o escotismo que praticava. Sempre acreditou que dali sairia bons chefes e com isto o escotismo só tinha a ganhar. – Chefe Julião já chegou? Perguntavam os primeiros a chegar na arena geral do campo escola. Era sempre o primeiro, mas neste chegou em cima da hora. Não comentou com ninguém a dor no peito e a falta de ar quando saia de casa rumo ao curso. Nem mesmo disse a Mamã sua esposa o que sentia, pois sabia que ela iria fazer tudo para ele não ir. – Não posso ficar como um pária, um excluído sem dar minha colaboração ao meu amado escotismo. 79 anos e sabia que não iria parar nunca. Sempre diziam que ele iria viver para sempre.

                 Fez questão de cumprimentar um por um dos alunos, dar um abraço e um sorriso como se ele o aluno fosse mais importante que o Diretor. Reuniu sua equipe composta de quatro chefes e uma Chefe. Ele conhecia um por um, alguns ainda não tinha atuado com ele e iriam aprender muito. Nunca acreditou em equipe finita, pois todos deviam ter as mesmas oportunidades em ter seus conhecimentos aumentados conforme ele mesmo defendia nos seus cursos. – Podemos sim mudar se preciso, mas o que B-P deixou com seu método e o programa Escoteiro este é imutável. Nunca discutiu tais ponto de vista com nenhum outro formador. Quando diziam diferente ele comentava: - Mudam muito e ouvem pouco e o pior não ficam muito tempo para ver o que fizeram!

                 Tinha realizado duas reuniões antecipadamente com a equipe. Dois eram velhos conhecidos e os demais não. Em cima da hora pediu ao Chefe Alvorada para formar a Tropa. Fazia questão da disciplina e disto não abria mão. – Todos terão oportunidade para se manifestar no andar do curso. Isto era uma rotina onde ele ouvia um por um, seja em uma dinâmica ou mesmo nas horas de tempo livre que aproveitava para passear nos campos de patrulha e amigavelmente ouvir e quem sabe aconselhar se preciso. Apresentou-se rapidamente e pediu que a equipe fizesse o mesmo. Todos deveriam dizer sua experiência escoteira, do Formador ao aluno mais novo. Sempre dizia a si mesmo e aos demais que se você não sabe fazer a massa não sabe fazer o pão.

                 Ele tinha poucas palestras para fazer. Fazia questão dos Deveres para com Deus e disto não abria mão mesmo sabendo que esta unidade didática não mais estava sendo usada entre os formadores de então. Programando o programa, Lei e promessa e sistema de patrulha eram outras que ele se sentia bem ao palestrar junto aos alunos. – Sem isto não temos escotismo, se outros não fazem é um direito deles e espero que tenham bastante experiência para contradizer e demostrar em suas tropas que o que fazem está dando certo. Após as rotinas de início, liberou as patrulhas para escolherem seus campos e deu duas horas para tudo estar pronto. Tudo? Isto mesmo. Cozinha com toldo e fogão suspenso, barracas armadas e mesa com bancos e toldo. Sem esquecer as fossas e a latrina de campo. Afinal era um curso da Insígnia de Madeira e não podia ter “Pata Tenras”.

                Muitos duvidavam que duas horas fossem suficiente. Mas os chefes alunos sorriam e iriam demonstrar para os incrédulos que eles não iam falhar. Julião quando viu todos pegando sua tralha e indo para seus campos começou a sentir uma dor no peito e viu que ela não iria parar. Pegou um analgésico, um copo de água e tomou. Isto sempre bastou para parar. Não naquele dia, começou a cair e foi amparado por muitas mãos que ainda estavam ali na Arena Geral. Uma ambulância foi chamada e muitos acharam que desta vez não tinha volta. Sua família foi avisada e no leito do hospital ele exigiu que o curso não fosse interrompido. Passou o bastão para o mais antigo. Ficou cinco dias entre a vida e a morte. Acordou no nono dia véspera de natal e viu que o quarto estava cheio de amigos.

              - E o curso? Perguntou. – Chefe, mesmo com a preocupação com sua saúde ele foi feito conforme suas instruções e sempre observado as exigências de Gilwell. Uma grande fotografia dos cursantes adornada em uma moldura foi entregue a ele que em posição de sentido davam seu sempre alerta ao seu mentor que não pode ir até o fim. Julião olhou para a foto e seus olhos ficaram molhados com as lagrimas que caiam. Sua esposa ao seu lado o abraçou, seus filhos vieram para ficar juntos a ele naquele instante. Julião ficou mais vinte dias no hospital. Durante mais seis anos Julião ainda permaneceu na terra, mas sem fazer o que mais gostava. O escotismo para ele estava na alma no coração e na mente.


Faleceu aos 93 anos dois dias antes do Natal. Quem estava presente nunca esqueceu o que disse: - Mamã! Está na hora de partir. Era assim que ele chamava sua esposa. Ele chorando o beijou. Seus filhos o abraçaram pela última vez. Julião foi sepultado no dia 24 de dezembro daquele ano. Não houve milagres, pois sua hora havia chegado. Até hoje ele é lembrando pelo seu sorriso e pelo seu abraço que fazia questão de dar a cada um dos alunos que tiveram a honra de participar dos seus cursos. Na lembrança suas palavras permanecem até hoje: - Chefes aprendam muito, sorriem muito para seus escoteiros e Escoteiras, e não esqueçam nunca: - Quem não sabe fazer a massa não sabe fazer o pão!

domingo, 18 de dezembro de 2016

Chefe! Reme sua própria canoa...


Chefe!
Reme sua própria canoa...

              Plutarco era um Chefe Escoteiro exibido que gostava de mostrar os seus conhecimentos com arrogância e valentia e isto dava certa insatisfação aos seus escoteiros da Tropa. Tomarov um pioneiro era outro bem falante e agora assistente do Chefe Plutarco. Estilos iguais mostravam que o futuro da Tropa não era nada promissor. Tinham lá suas vantagens e desvantagens. O Acampamento de verão se aproximava. Seriam oitos dias e eles queriam escolher um bom local, boa aguada, lenha à vontade e muitas touceiras de bambus para pioneiria. Um pai havia lhe confidenciado que do outro lado do Rio Amarelo havia um lugar assim. Num sábado pela manhã puseram-se a caminho.

              Embrenhando em uma floresta nativa e chegaram a um arraial pequeno, onde se avistava o Rio Amarelo. Era um rio bem largo. Difícil sua travessia. Havia um barqueiro que atravessa as pessoas de um lado para outro. Em uma de suas viagens Plutarco e Tomarov embarcaram. Como bons falantes e entendidos iam mostrando aos demais suas inteligências e conhecimentos que passavam longe da dominação de um barco como aquele. Em dado momento Plutarco displicentemente pergunta ao barqueiro:

- Moço o senhor entende de escotismo?
- Não senhor respondeu o barqueiro.
- Tomarov e Plutarco compadecidos e rindo disseram: - É pena porque perdeu uma das mais lindas filosofias. Tomarov o Pioneiro que sempre foi metido a entendido em todo tipo de assunto querendo esnobar mais ainda o pobre barqueiro sapeca outra pergunta:

- Senhor Barqueiro, o senhor conhece nossa Lei?
- Também não – Respondeu o remador.
- Que pena – Condói-se o pioneiro.
E arremata: Você perdeu metade do esplendor do escotismo.

             A viagem seguia com os dois desfazendo do pobre barqueiro e seus conhecimentos do escotismo. Após cansarem das perguntas se entreolhavam e riam entre si. Alguns embarcados calados viam a pose dos dois chefes escoteiros falantes e não disseram nada que pudesse interpretar a sua falta de conhecimento deste tal movimento Escoteiro que nunca tinham ouvido falar. Em dado momento para surpresa de todos, uma grande onda chega e vira o barco.

- O barqueiro preocupado, grita aos dois que estavam afundando:
- Você Chefe Escoteiro e Pioneiro sabem nadar?
- Não! – Responderam eles rapidamente.
- Então é uma pena – Concluiu o barqueiro.
- Vocês perderam toda a sua vida!


Moral: - Quem acha que sabe tudo não sabe nada. Risos.

sábado, 17 de dezembro de 2016

Contos de Fogo de Conselho. O sabor da ternura.


Contos de Fogo de Conselho.
O sabor da ternura.

                 Um Escoteiro daqueles aventureiros e descobridores de terras longínquas caminhava em uma trilha quando observou um pequeno rio que começava tímido por entre as pedras. Como ele era um aventureiro gostava de aventurar-se por “mares nunca antes navegados” resolveu seguir o rio por longas distancias. Aos poucos ele foi tornando um rio maior. O Escoteiro sorriu para si mesmo e aceitou o desafio seguindo-o por muitos quilômetros.

                 Notou que após percorrer uma boa dezena de quilômetros o que era um pequeno rio dividiu-se em dezenas de cachoeiras, em um esplêndido espetáculo de águas cantantes. Ele ficou maravilhado com aquela visão e a melodia das cachoeiras atraiu mais e mais o Escoteiro que se aproximou de onde vinha o som e foi descendo entre as pedras ao lado de uma das cachoeiras.

               Foi então que ele finalmente descobriu uma gruta onde a natureza criara com paciência caprichosa, lindas formas na gruta. Destemido, pois era um Escoteiro famoso pelas suas grandes descobertas ele foi adentrando, admirando sempre mais as pedras gastas com o tempo.

               Para sua surpresa de repente ele descobriu uma placa feita a mão com uma ponta de aço encrustada nas pedras. Ficou surpreso ao ver que alguém estivera ali antes dele. Com sua lanterna, iluminou os versos que nela estavam escritos. Eram versos lindos do grande escritor Tagore que recebeu o prêmio Nobel de literatura há muitos e muitos anos atrás. Dizia: - Não foi o martelo que deixou perfeitas estas pedras, mas a água, com sua doçura, sua dança e sua canção.


                O Escoteiro um grande aventureiro e explorador terminou a leitura na pedra: - “Onde a dureza só faz destruir, a suavidade consegue esculpir”.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

O relógio de Madalena.


Contos para Fogo de Conselho.
O relógio de Madalena.

                               O Grupo Escoteiro que Madalena participava quando menina costumava encerrar as atividades de fim de ano com uma grande cerimônia de Bandeira em praça pública.  Ela adorava aquela festividade porem nunca fui convidada para ser escolhida como responsável para o hasteamento da Bandeira Nacional o que lhe trazia certa mágoa. Quando fez treze anos avisaram a ela que finalmente ela seria escolhida para o hasteamento da bandeira Nacional. Ela sorriu e ficou felicíssima. Mas este estado de espírito durou pouco. Escolheram outra escoteira para ser aquela que seguraria a bandeira. Sua decepção foi tremenda. Voltou para casa com os olhos cheios de lágrimas.

                              Sua mãe quis saber o que se passava e ouviu toda sua história entre lágrimas e soluços. Sem nada dizer ela foi buscar um bonito relógio de bolso de seu pai e o colocou em suas mãos dizendo: - O que é isto que você está vendo? – Um relógio de ouro com mostrador e ponteiros. – Em seguida a sua mãe abriu a parte traseira do relógio e repetiu a pergunta: - O que você está vendo?  Ela respondeu: - Ora mamãe, aí dentro parece haver centenas de rodinhas e parafusos! – Sua mãe a surpreendia, pois aquilo nada tinha a ver com o motivo de seu aborrecimento. Entretanto calmamente ela prosseguiu: - Este relógio tão necessário ao seu pai e tão bonito seria absolutamente inútil se nele faltasse qualquer parte, mesmo a mais insignificante das rodinhas ou o menor dos parafusos.

                            Ela e sua mãe trocaram um olhar calmo e amoroso, ela compreendeu que sem que ela precisasse dizer mais nada. Essa pequena lição tem ajudado muito a Madalena para ser feliz como escoteira e em sua vida. Aprendeu com a máquina daquele relógio quão excenciais são mesmo os deveres mais ingratos e difíceis, que cabem a todos nós. Afinal ela tinha uma patrulha para ajudar.

                             Não importa que sejamos o mais ínfimo parafuso ou a mais ignorada rodinha, desde que o trabalho, em conjunto, seja para o bem de todos. Ela percebeu também que se o esforço tiver êxito o que menos importa são os aplausos exteriores. O que vale mesmo é a paz de espírito e do dever cumprido!


(Adaptado do livro: E, para o resto da vida... de Wallace Leal V. Rodrigues).

Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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