terça-feira, 26 de julho de 2016

Nico Fulgêncio e os Anjos Escoteiros.


Vale a pena ler de novo.
Nico Fulgêncio e os Anjos Escoteiros.

                         - Olha Senhor Nico Fulgêncio, vou ser sincero, o senhor já passou dos sessenta anos e isto que o Senhor tem em nossa cidade não podemos fazer nada. Um tumor tomou conta do seu cérebro e se não tratar em uma cidade grande o Senhor não terá mais que um ano de vida! – Nico Fulgêncio olhou para o doutor, franziu a testa e não disse nada. Ele se lembrava quando descansava na Praça Santo Estevão sentiu uma tontura e nada mais lembrava. Deve ter caído e o levaram ao hospital próximo. Sorriu para o Doutor e foi embora. Há tempos ele sentia esta tontura. Agora piorou ele caia onde andava. Maria Mercês sua vizinha o olhou com pena. A Ambulância o trouxera até o barraco na Rua B sem número. Ele sorriu para ela e entrou em sua morada.

               Nico Fulgêncio era negro, magro, não sabia ler nem escrever. Trabalhou muitos anos de vigia na Fábrica de Doces até que o mandaram embora. Oito anos desempregado. Não tinha muitos amigos e através deles ainda sobreviveu com a ajuda que lhe davam. Nico pensou em acabar com sua vida, mas porque faria isto? Só porque o médico foi honesto? Nico Fulgêncio tomou uma resolução. Uma sacola e a mochila que Juventino lhe deu colocou lá as roupas que lhe restavam, uma fronha, um cobertor Velho e uma capa azul escura que ganhou quando vigia na empresa. Na despensa quase nada, mas ainda achou um pouco de arroz, feijão, tinha uma carne seca e quatro pães velhos. Embrulhou tudo e colocou na mochila. Andava sempre com chinelo de dedo e tinha uma “alpercata” das antigas. Nem fechou a casa. – Donde vai seu Nico Fulgêncio? – Embora para a cidade grande Dona Maria Mercês. Olhe, o barraco é seu tudo que encontrar lá também. Nunca mais vou voltar!

                  Nico Fulgêncio colocou um boné Velho, e saiu sem se despedir de ninguém. Agora seria um daqueles andarilhos de beira de estrada que sempre encontramos por ai. Ninguém na cidade perguntou aonde ia. A cidade o considerava um eterno desconhecido. Quando partiu era meio dia. Pegou a Estrada para Maceió. Asfaltada. Andou a tarde toda e já noitinha parou embaixo de um pé de Pequi enorme. A barriga doía de fome. Viu que tinha arroz e feijão, mas esqueceu da panela. Comeu um bom pedaço da carne seca e um pão velho e dormiu sob as estrelas. Acordou com o sol nascendo e partiu. Donato um dia lhe disse que de ônibus a São Paulo eram quatro dias. E a pé? Ele riu, não era importante. Tinha tempo muito tempo. Eram quatro da tarde quando avistou uns meninos Escoteiros brincando em volta de umas barracas. Parou e ficou olhando. Gostava do que via. Ele gostava da alegria do sorriso das crianças. Um carro da policia parou ao seu lado. Meteram ele lá dentro e o levaram preso. O acusaram de molestador de menores.

                  Nico Fulgêncio ficou preso oito dias. O delegado resolveu conversar com os Escoteiros da cidade e eles disseram ter visto o andarilho, mas ele não fez mal a ninguém. O soltaram. Pelo menos ele teve duas refeições na cela. Nico Fulgêncio partiu como tinha traçado seu destino. Na saída da cidade novos Escoteiros o procuraram. Deram-lhe um saco de comida. Ele riu. – Preciso de uma pequena panela disse. Um deles em sua bicicleta partiu em alta velocidade. Pouco tempo depois chegou com a panela. Partiram dizendo a ele Sempre Alerta! Lá foi ele estrada a fora. Andou até escurecer. Achou melhor ficar por ali. Nem bem escureceu e surgiu uns Escoteiros maiores. Eram rapazes cantando estrada a fora. Pararam ao lado dele para descansar e lanchar. Foi convidado. A vida estava sendo boa com Nico Fulgêncio. Eles partiram e ele dormiu com a barriga cheia.

                   Foram quatro meses para chegar a Maceió. Aprendeu a ganhar comida nas casas que encontrava a beira do caminho. Aprendeu a viver com o vento e a chuva e teve um dia que achou que sua hora tinha chegado. Desmaiou e acordou em um pequeno hospital. Em volta dele duas meninas e quatro meninos Escoteiros. De novo? Eles sorriram e perguntaram como estava. A enfermeira disse que foram eles que o trouxeram. Dez dias e teve alta. Os meninos Escoteiros o acompanharam até o final da cidade. De Maceió chegou a Recife. Bela cidade. Em uma rua viu a meninada escoteira correndo para sua sede. Ele agora se achava um deles e entrou no pátio, deu Sempre Alerta e todos responderam. Os Chefes ficaram de olho. Ele contou em uma roda cheia de meninos e meninas de onde veio e para onde ia. Contou também dos meninos Escoteiros que encontrou. De novo lhe deram uma mochila cheia de víveres.

                     Um ano depois Nico Fulgêncio chegou a Belo Horizonte. Ele sabia agora que aqueles escoteiros foram sua salvação. Por onde passava sempre encontrava um deles. Parou próximo a Rodoviária e viu muitos esperando a hora do seu ônibus. Se apresentou contou sua aventura e recebeu abraços e saudações. Nunca fora Escoteiro, mas admirava aqueles meninos que sempre estavam dispostos a ajudar. Pé na estrada e lá foi ele para São Paulo. Oito meses o andarilho gastou na Fernão Dias. Quando chegava a Guarulhos ficou estarrecido. Estava escurecendo e viu um homem enorme atacando uma Escoteira. Ele sabia o que ele ia fazer. Soltou sua mochila e saiu correndo em cima de malfeitor. Levou um tiro nas costas e outro no ombro. Policiais logo chegaram e o socorreram depois que a escoteira explicou tudo que aconteceu.

                      Nico Fulgêncio foi levado ao Hospital de Guarulhos. Assustou quando viu um enorme contingente de meninos e meninas Escoteiras. Todos querendo abraçá-lo, pois sabiam do acontecido. O tiro entrou pelas costas e saiu pela frente. Nico Fulgêncio não correu risco de vida. O médico gentil que se apresentou como Chefe Escoteiro disse para ele que mais doze dias poderia ir embora – Parabéns Senhor Nico Fulgêncio, o senhor está com uma saúde de ferro! Mas Doutor! E o tumor em meu cérebro? – Que tumor senhor Nico, o senhor não tem nada. Lagrimas correram pelos olhos de Nico Fulgêncio. Quando saiu o Chefe Wantuil lhe ofereceu um emprego de vigia no Grupo Escolar onde funcionava a sede. Os meninos e as meninas Escoteiras bateram palmas e agora ele sabia que tinha muitos amigos que eram anjos sem asas. Jovens alegres que lhe deram tudo na sua longa jornada.


A vida de Nico Fulgêncio se transformou para melhor. Ia sempre as reuniões e participava da bandeira. Lhe deram um uniforme usado e um belo dia fez a promessa. Todos que o conheciam sempre ouviam cantar uma canção do Padre Marcelo: Tem anjos voando neste lugar. No meio do povo e em cima do altar. Subindo e descendo em todas as direções, Não sei se a igreja subiu ou se o céu desceu Só sei que está cheio de anjos de Deus. Porque o próprio Deus está aqui. Nico Fulgêncio não morreu naquele ano e nem nos que vieram depois. Aquele caminheiro de muitos mil quilômetros de estrada percorrida, teve a felicidade de ver meninos Escoteiros que se tornaram seus filhos e seu salvador. Nico Fulgêncio na sua simplicidade sorriu, e pensou – Os anjos também são Escoteiros! Seja um anjo para alguém, dê asas à sua vida, mostre a ele quer é possível voar!

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