quinta-feira, 30 de julho de 2015

E o céu foi testemunha.


Lendas Escoteiras.
E o céu foi testemunha.

                Um sábado gostoso, o frio arrefeceu um pouco e o sol voltou a brilhar. Meus dias de sábados eram um só, ou excursionar, ou acampar, ou uma atividade aventureira qualquer ou uma modorrenta reunião de sede. Porque modorrenta? Ora, a gente era menino e menino queria aventuras. Queria colocar o pé na estrada e descobrir novos caminhos e novas trilhas. Ver a barraca armada, fazer sua “caminha” em um canto dela; correr em volta procurando bambus e construir ali o que sua casa possuía eram questão de honra. Mas hoje não. Hoje era dia de reunião. Passei na casa de João Grilo, ele já estava na porta a me esperar. Nada como um sempre alerta, um aperto de mão e com os braços nos ombros um do outro descemos a Rua Dr. Quinhão até a sede. Era perto, e pela travessa do Tolentino vi a Nenê e a Lucy de mãos dadas também seguindo rumo à sede. Perguntava-me sempre porque todos iam garbosos com seus uniformes com um sorriso nos lábios. Coisa do oitavo artigo ou coisa de gostar demais do que fazíamos?

                  Eu amava aquela Tropa, aquele grupo, sentia-me feliz com meu Chefe Tambor. Tambor? Quem colocou nele este apelido? Será pelo tom de voz? Não tinha nada parecido, mas o nosso Chefe era demais. Em todas as horas em todos os momentos era um amigo, um irmão mais Velho. Ele sempre aprontava uma quando chegávamos à sede. Uma vez o procuramos e nada. Esperamos cinco dez minutos e nada. Ele sempre foi pontual. Fazia questão. Dizia para nós que a pontualidade era uma questão de honra. Eis que ele surgiu segurando uma roldana descendo a toda por uma corda do alto da Magnólia. Chefe Tambor, sempre aprontando uma. Fomos para os cantos de patrulha. Nenê e Lucy eram da patrulha Garça. Só de meninas, eu e o João Grilo da Onça Parda. Pintassilgo da Touro chegou perguntando se viram ou tiveram notícia do Chefe Tambor. Nada. Ele foi de patrulha em patrulha tentando alguma notícia. A hora do cerimonial chegou. Nada do Chefe Tambor. Naldo Orelhudo chamou os monitores. Naldo era o mais antigo e ele sabia que se um dia o Chefe não aparecesse ele devia assumir com todos os demais monitores.

                O chifre do Kudu tocou alto. Naldo era bom nisto. Treinou meses. Corremos a formar. Chefe Isabel perguntou pelo Chefe Tambor. Explicamos. Ela assumiu o cerimonial. Bandeiras subiram aos céus. Bolota o gordinho da Pica Pau fez uma bela oração. Naldo chamou os monitores para a inspeção. – E o jogo? Perguntamos. – Ideias, quero ideias e sugestões ele disse. Várias. Jogos de corridas sempre. Ninguem gostava de jogos parados. A patrulha Múmia? Todos sorriram. Cem metros correndo todos amarrados entre si, fazendo uma tocha humana era bom demais. Tombos e mais tombos, sorrisos e mais sorrisos. Sentados em baixo da Magnólia com aquela sombra enorme pensamos o que seria depois. Começamos a cantar Adeus montes e Vales Queridos. Paramos uma figura e tanto apareceu na porta do pátio. Parecia enorme. Uma barba branca que ia até o pescoço. Um chapéu Escoteiro diferente, mais para grená do que marrom. Bem uniformizado e sua calça curta impecável. Usava perneiras e o chapéu continha um penacho azul. Segurava uma forquilha linda.

               Entrou no círculo, sorriu, que lindo sorriso. Fez uma saudação nos trinques. Não disse o nome, só perguntou: - Posso me assentar com vocês? Todos disseram sim. Como se fosse um índio experiente assentou com as pernas cruzadas. – Posso lhes contar uma historia? Ele disse. Todos disseram sim. Naldo educadamente perguntou: Qual o seu nome Chefe? – Ele riu. Meu nome? Podem me chamar de São Patrício. Ninguem entendeu. Era um religioso? - Calma continuou moro muito longe daqui. Visito tropas Escoteiras escolhidas, aquelas que sinto o cheiro da felicidade, aquela que vejo nos olhos a sede de aventura, aquela que acredita que nossa lei vale mais que a própria honra e daria a vida por ela. – Ninguem dizia nada. Um silêncio enorme. Chefe São Patrício nos olhou e chamou um por um pelo nome. Disse que estava orgulhoso em nos conhecer. – Em seguida ficou de pé e começou a contar sua historia:

- Meus amigos escoteiros quando um problema se mostrar difícil, lembrem-se dessa historia que estou a contar. Havia dois náufragos no mar revolto. Um se debateu lutou continuamente contra as ondas ate esgotar sua energia e afundou. O outro, ao invés de dar braçadas contra o mar, apenas boiou, não gastou energias e pode assim, se salvar! Uma emoção sublime tomava a todos. O silencio era total. O tempo era ali uma eternidade maravilhosa. Incrível mesmo descrever a emoção que todos estavam tomados. Ela continuou: Quando invadirem em vocês os impulsos da altivez, do orgulho e superioridade, pare e olhe para o mar, a terra e as estrelas que existem há bilhões de anos e entendam – Suas importâncias, seus brilhos, suas superioridades aqui são diminutos se comparados com tudo o que vêem. São poeira perante as estrelas e um piscar de olhos. Mas se ao contrário se sintam pequenos demais, percebam que a vocês foi dado algo que as estrelas não têm. Elas são inanimadas e executam rumos fixos predeterminados pelo Senhor do Universo. Vocês, porém tem vida, podem rir cantar e amar...

- Finalizou dizendo: - Vocês não podem mudar certas circunstâncias ou situações, mas podem adaptar-se a elas sempre, escolhendo a forma do mal menor. Pode não ser o ideal, mas será o melhor. Aproveitem as oportunidades que lhes derem, mesmos que sejam aparentemente pequenas. As grandes árvores vêm de pequeninas sementes. Quem está disposto a subir grandes montanhas de felicidade deve estar preparado também para descer enormes ladeiras de decepções. No entanto, a chance de chegar ao topo e sentir algo que o acompanhará para o resto da vida pode valer o risco.


                          Ele se calou. Vimos nos seus olhos um brilho estranho. Não sabíamos se ele chorava ou se ria. Pediu licença e foi apertar a mão de cada um dos escoteiros ali presente. Disse um adeus, deu um até logo e completou: Sempre estarei no coração de cada um de vocês. Se quiserem falar comigo é só chamar e partiu. A Tropa não sabia o que fazer. Estava estática e assim ficou. Alguns minutos se passaram em silêncio profundo. Um som nosso conhecido ouvimos entrando na sede. O Chefe Tambor chegava pedindo desculpas pelo atraso. Entreolhamo-nos. Seria mais uma dele? Ele nada disse e nós não perguntamos. A reunião terminou no horário. Eu e Joao Grilo íamos calados pela Rua do Sacramento. Eu parei e olhei para ele? – Seria São Patrício o Chefe Tambor? Ele mexeu com a cabeça como a dizer não. – E mais alto e tem os cabelos e barbas grisalhos. Agora era esperar o próximo acampamento. Despedi de João Grilo e fui para minha casa jantar...

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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