segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Samuel Escoteiro e as Sete Pragas de Rio Mimoso.


“Que as pulgas de mil camelos infestem o meio das pernas da pessoa que arruinar seu dia, e que os braços dessa pessoa sejam curtos demais pra se coçar”...

Samuel Escoteiro e as Sete Pragas de Rio Mimoso.

                   Foi em uma tarde gostosa do mês de abril que encontrei o Chefe Lépido (Marco Emilio Lépido) próximo a praia de Pocitos em Montevidéu. Gente fina. O conheci ha muitos anos em um Seminário Internacional Escoteiro em San José, na Costa Rica. Ficamos amigos. Amicíssimos. Fazia mais de dois anos que não o via. Sentamos em um Café de frente para o mar e conversamos até altas horas da madrugada. Eu iria retornar ao Brasil no dia seguinte e ele iria partir para a Cidade do Cabo na África do Sul. Ele era um contador de histórias nato. Eu gostava do jeito dele. Narrava e vivia com as mãos e o corpo o desenrolar da história. No Café alguns clientes deram risadas.

                  Realmente era uma história inverossímil para os dias de hoje. Como ele era Escoteiro dos bons, fiz de conta que acreditei. Mas vamos aos entretantos e deixemos os finalmentes para depois. – Meu amigo, estive lá uma semana depois do acontecido. Rio Mimoso não tinha mais que vinte mil habitantes. Gostei muito do Grupo Escoteiro de lá. Turma excelente. Foi um Escoteiro de nome Samuel, mais ou menos treze anos que me contou toda a história de Rabequita. Folclore da cidade, ninguém lembrava quem eram seus pais e só sabiam que ela morava no Morro da Tristeza. Morar lá era o fim do mundo. Rabequita andava o dia inteiro pela cidade apoquentando todo mundo. Não falava palavrões, mas dizia cada coisa que todos corriam dela como o diabo corre da cruz.

                  Só podia ser maluca diziam. Porque não a internam num hospício por ai?  Mas quem tinha esta coragem? O Prefeito Bafodonça tinha medo dela. O Dr. Pasquelino Gonzaga Juiz de Direito dizia que nem perto dela ia chegar nunca. O Delegado Praxedes lavou as mãos. Por mim ela vai morrer em Rio Mimoso e olhe, pretendo ir ao seu enterro. E dava boas risadas. Quem não gostava nada disto era as Damas dos Bons Costumes da cidade. Faziam tudo para sumir com ela de lá. – Uma praga para nós diziam. Nunca seremos bons anfitriões com ela mexendo com nossos poucos turistas. Ainda bem que ela tinha um fã. Samuel da Patrulha Corvo. Ninguém na Patrulha e na tropa entendiam nada.

                 Todo sábado pela manhã, antes da reunião ele a levava a sua casa e dizia para ela tomar banho. Só tomava banho aos sábados. Sua mãe bem velhinha fazia de conta que não via nada. Samuel sempre conseguia roupas limpas para ela junto às famílias escoteiras. Ninguém entendia nada. Bem cedinho lá estava Samuel na avenida principal e a levava segurando em sua mão e os dois sem dizer uma única palavra em direção a sua casa. Rabequita gostava ou pelo menos fingia que gostava. Depois do banho Samuel Escoteiro oferecia um lauto almoço. Ela saia antes dele ir para a reunião Escoteira sorrindo e cantando.

                  O Chefe Joventino achava que Samuel era um bom Escoteiro fazendo aquele tipo de boa ação. Conversava sempre com ele e perguntava por que ela o obedecia e mais ninguém. Samuel não respondia. O mês de janeiro prometia. Um sol escaldante, nada de chuva. A represa que abastecia a cidade estava secando. Na igreja um movimento enorme para a procissão que as Damas dos Bons Costumes realizava diariamente. Pediam a São Tomás de Aquino e não a São Pedro e rezavam para ele trazer chuva. Uma vez, duas vezes os escoteiros foram, mas pediram o Chefe para não ir mais. Sempre quando as Damas marcavam uma procissão eles inventavam um acampamento ou uma excursão.

                   Rabequita só olhava de longe e dava gargalhadas enormes. – Alcoviteiras, viúvas de São Pedro, vagabundas da cidade ela gritava em cima de um caminhão estacionado enquanto a procissão passava. As Damas estavam “por aqui” com Rabequista. Chamaram o Bispo, pois o padre não resolvia nada. O bispo telefonou ao prefeito que telefonou ao juiz que telefonou ao Delegado e nada. Rabequita não parava de praguejar. Agora ela fazia questão de deitar no chiqueiro do Seu Gastão só para que o seu cheiro se tornasse horrível para quem fosse à procissão. O Padre Norberto não queria se envolver. Toda vez que procurou Rabequita ela o mandava para aquele lugar.

                    O jeito foi trocar o delegado, pois o Senhor Praxedes tinha um medo dela enorme. Prometeu chegou à cidade de Rio Mimoso sabendo da fama de Rabequita. – Deixa comigo dizia. Coloco-a no xadrez por dois dias e ela vai aprender com quantos paus se faz uma canoa. Nem bem tomou posse e foi dar uma volta no centro da cidade. Não tinha como fugir. Lá estava Rabequita parando o trânsito, chingando e jogando pedra nas vitrines das lojas. Não deu outra. Pegou-a pelo braço e arrastando jogou-a no fundo do xadrez da delegacia. Rabequita gritava e praguejava dizendo que o delegado Prometeu ia prometer nas “prefundas dos infernos”. Samuel Escoteiro quando soube correu até a delegacia e pediu ao Delegado Prometeu que a soltasse. Ele riu. Vai para sua Patrulha menino. Não me enches a paciência se não coloco você junto com ela.

                   Não se sabe como, mas uma colmeia de abelhas africanas invadiu a delegacia. Milhares e milhares delas. O escrivão e dois soldados se mandaram com a cara inchada de mordidas. O Delegado Prometeu não podia fazer nada. Durante cinco dias só entrava o Senhor Periquito do restaurante Bom Menino e mesmo assim usando um protetor que pediu emprestado ao Senhor Baunilha, um apicultor que criava abelhas lá para o lado de Rochas do Prego Solto. Ele sempre encontrava Rabequita rindo, dando gargalhadas e interessante, nenhuma abelha a mordia, passeavam no seu corpo e pareciam estar em festa. Samuel pediu ao delegado Prometeu para falar com ela. Sabia que só ela tiraria as abelhas da Delegacia.

                 Dito e feito. O delegado soltou Rabequita e as abelhas sumiram. – Querem chuva? Gritava para o povo na procissão. Vou lhes dar chuva! E ria. E gargalhava. Trovões ribombaram nos céus. Uma chuva torrencial. O povo dançava e cantava. Um dia, dois dias, três quatro uma semana. A chuva não parava. A ponte sobre o rio mimoso ameaçava desabar. O rio já passava sobre ela. As ruas da cidade foram tomadas pela enchente. Rabequita dançava na chuva. Quem tivesse assistido ao filme Cantando na Chuva ia se deliciar. Rabequita arrumou um guarda chuva furado e corria pelas ruas, segurando no poste e cantando.

                 A Tropa Escoteira estava em reunião. Decidiam se iam cancelar o acampamento de quatro dias que iam fazer nos Morros Uivantes das Pedras Nuas. Era o acampamento mais esperado do ano. – Chefe disse Samuel posso tentar parar a chuva? – Todos riram. – virou milagroso? Disse o Monitor da Falcão. – Posso tentar? Faça o que quiser Samuel, disse o Chefe Joventino e não disse mais nada. Combinou-se de dar dois dias para a chuva parar. Lá foi Samuel procurar Rabequita. Quando ela o viu abaixou a cabeça e deu-lhe a mão. Achou que era dia do banho mesmo que estivesse tomando banho há dias naquela chuvarada. Samuel falou baixinho no seu ouvido – Rabequita, se a chuva não parar não poderemos acampar!

                  Uma hora depois o sol apareceu no céu. A chuva acabou. O acampamento foi um dos mais bonitos que a tropa fez. O Delegado Prometeu não se deu por vencido. Se esta feiticeira acha que vai rir de mim está redondamente enganada. Telefonou para Mar das Vertentes e falou com o delegado de lá. Pediu um rabecão para levar uma doida e internar no Hospício Esperança Feliz. Dito e feito. Levaram Rabequita a noite. Ninguém viu. No dia seguinte não amanhecia. Sempre noite. O que ouve? Outra praga de Rabequita? Um dia, dois três e o dia não aparecia. Procuraram a mulher em todo lugar e não acharam. O Delegado Prometeu ficou cismado. Cacilda! A mulher tinha parte com o Demônio? O Coisa Ruim? Mandou trazê-la de volta. Ela o olhou e disse? A próxima vez você vai virar um macaco prego. Irá morrer de tanto comer banana.

                O Prefeito Bafodonça e o Dr. Pasquelino Gonzaga o Juiz de Direito, reuniram a fina flor da sociedade local. O que fazer? Chamaram também o Escoteiro Samuel. Afinal ele era íntimo dela. Ninguém sabia explicar isto, mas ele seria a melhor pessoa para aconselhar. Querem resolver? Perguntou Samuel. Dê a ela uma casinha boa perto do Cemitério do Paletó Preto. Que a cada dez dias o Senhor Marombático do Supermercado Preço Alto entregue na casa dela uma sesta de mantimentos. Todo mês mandem levar para ela duas caixas de charutos Cohiba, aquele que o ex-presidente Lula fuma. – Mas este charuto é caríssimo disse o Delegado Prometeu. O prefeito interferiu. - Tudo bem. Assim foi feito. Durante cinco meses a calma voltou a reinar na cidade de Rio Mimoso. Tudo piorou quando o seu Marombático do Supermercado Preço Alto não estava mais fazendo as entregas no prazo e o pior, colocava produtos de terceira.

                Um inferno. Milhares de pássaros no céu gritando, voando e bicando as cabeças dos transeuntes e o pior, fazendo necessidades nas cabeças das pessoas. Ninguém tinha sossego. Saia de terno e voltava-se borrado! Outra reunião, seu Marombático pediu desculpas. Mesmo em sua casa nova, com chuveiros e até colocaram lá uma Banheira Branca linda de morrer ela não tomava banho. – Manuel meu Escoteiro, se eu tomar banho todo dia quem vai “feder” é a cidade. Enquanto eu ficar fedendo a cidade fica cheirosa. Manuel não acreditou. Exigiu que ela tomasse banho todos os dias. Disse que faria dela uma dama e quem sabe ela encontraria um marido para cuidar dela?

               No domingo um mau cheiro soprava dos lados da sede do Perneta Footboll Club e só aumentando. Foram lá e não encontraram nada. A cidade em peso de mascaras. Janelas fechadas, mesmo assim estava difícil viver. Ninguém sabia o porquê. Só Manuel. Não teve jeito, pediu a ela para parar de tomar banho. O cheiro desapareceu. Rabequita pediu um carro. Novo. Zero quilômetro. Manuel foi ao seu encontro. – Porque não posso? Afinal a cidade me deve muito! O Prefeito Bafodonça explodiu! Nunca andou nem de bicicleta e agora quer um carro? Arrependeu do que fez. Parece que os fantasmas do outro mundo estavam à solta. Nem bem escurecia e lá estavam eles vindo do Cemitério Paletó Preto. Zumbis, Mula sem Cabeça, Lobisomens, Esqueletos andantes, uma verdadeira procissão fazia a festa na praça da cidade.

                 O Carro foi entregue. Um Honda Civic vermelho lindo de morrer. As Damas dos Bons Costumes cuspiam de ódio. Muitas delas não tinham aonde cair sentada. Resolveram botar fogo na casa de Rabequita. Tentaram mas não conseguiram. Voltaram para suas casas frustradas. O pior todas estavam pegando fogo! Meu Deus! É um demônio não é uma mulher!  Bem a história termina aqui. Samuel me disse que Rabequita cansou da cidade de Rio Mimoso. Mudou-se para a cidade de Boina Verde. Quando ela se foi, um foguetório enorme se fez rebombar na cidade. Uma festa enorme. Que se danem o pessoal de Boina Verde.

                  Dei belas risadas e fiquei olhando para o meu amigo Lépido. Ele me olhava com expressão galhofeira. Verdade isto meu amigo? Palavra de Escoteiro disse. Tomamos mais umas duas cervejas Westmalle, pois o garçom disse que era uma das melhores do mundo. Despedimo-nos e cada um foi para o seu lado. Uma quarteirão antes do hotel que estava hospedado vi uma mulher desgrenhada, suja, um mau cheiro horrível e chegou perto de mim e disse – Me paga uma cachaça filho da mãe! Paguei. Sei lá se era a Rabequita. Montevidéu não tem disto, mas não se pode acender uma alma a Deus e ao Diabo ao mesmo tempo!

- Ganhar não é tudo, o importante é competir! (Péssimo, destrói essa, essa não ajuda em nada, nada mesmo!).


quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Jovelino Troca Letras, o Escoteiro herói de Santa Genoveva.


Dentro de cada um existe um super-herói implorando para fazer alguma diferença no mundo. Espertos aqueles que se deixam dominar por esse super-herói.
Jovelino Troca Letras, o Escoteiro herói de Santa Genoveva.


                Sempre quis contar a história de Jovelino Troca Letras. Não que fosse uma história fantástica. Nada disto. Mas como exemplo de vida vale a pena conhecer. Acho que foi o Chefe Malvino do mesmo grupo dele que me contou. Fazia mais de quinze anos quando aconteceu o fato de ele ter se tornado um Super Herói. Não vamos saltar a pedra de uma vez. Vamos escalar ponto por ponto para que cada um conheça melhor quem foi o Escoteiro Jovelino Troca Letras. Ele nasceu em Santa Genoveva lá pelos idos de 1950. Sua mãe trabalhava no correio e seu pai dizem que estava internado em uma unidade do Manicômio Judiciário de Terra das Vertentes. Diziam que nunca se recuperaria. Na cidade a família de Jovelino era considerada como “malucos”. Até os quatro anos ninguém viu nada de anormal em Jovelino. Tudo começou quando alguém observou que ele só ria. Diziam ser um riso de idiota e pouco falava.

               Ninguém ligou para isto, mas os colegas começaram a rir dele, fazer “chacotas”, chamá-lo de “biruta” entre outras coisas. O pior é que Jovelino quando articulava alguma palavra não saia o P, o R e outras letras. Passaram então a chama-lo de gaguinho, fanhoso e outros termos que melhor não publicar aqui. Jovelino nunca retrucou. Sempre com um sorriso nos lábios. Aos seis anos descobriu os escoteiros. Lá foi ele. Ficou a tarde toda assistindo as reuniões. Vibrava com os jogos e nesta hora em seu cantinho pulava e tentava emitir sons que dificilmente saia. Por vários sábados lá estava ele. Os lobinhos e os escoteiros davam belas risadas com sua maneira de agir. Muitos já o conheciam do Grupo Escolar e lá nas reuniões nunca disseram os nomes com que os outros o chamavam.

               A Akelá Márcia um dia perguntou a ele se queria ser lobinho. Seus olhos disseram tudo. Ele balançou a cabeça com a dizer que sim. Marcia ficou intrigada. Será que era mudo? Martinha veio ao seu socorro. Chefe, este é o Jovelino Troca letras, na escola todos dão boas risadas com ele. Ele é meio mudo, quase não fala. Só emite alguns sons. Marcia era ocupada. Terapeuta pouco tempo tinha para averiguar e conhecer a família de Jovelino. Brincou com ele e falou devagar – Jovelino! Peça a sua mãe para vir aqui. Certo? – Se ele entendeu ninguém soube, mas a mãe de Jovelino só cinco meses depois apareceu no grupo. Marcia sabia que não podia admiti-lo sem a presença dos pais. Neste interim Jovelino continuava lá, no seu cantinho, vibrando e gruindo, pois assim eram os sons que emitia.

                Jovelino até que tinha uma aparência razoável. Cabelos louros crespos e ondulados. Acho que nunca viu um pente em sua vida. Suas roupas eram humildes, mas limpas. Calçava uma sandália de dedo e parece que escovava sempre os dentes, pois estavam brancos e brilhantes. Magro, não era alto pela sua idade. A mãe de Jovelino explicou como ele era. Tentaram fazer com ele varias sessões de Terapia. Não deram resultados. Se era genético não sabiam. Ele fez alguns exames pelo INSS. Infelizmente lá eles não se interessaram pelo seu caso. Uma tarde a mãe dele apareceu. Conversaram muito. Marcia explicou que não tinham experiência no assunto, mas que podiam tentar. Jovelino Troca Letras foi aceito na Alcatéia e colocado na matilha azul.

                  Mesmo conversando com todos os primos os resultados foram desastrosos. Os lobinhos e as lobinhas sempre rindo dele. Difícil mudar isto. Oito meses depois o próprio Jovelino ia às reuniões, mas recusava-se a se formar. Dizia para a Akelá Márcia: - Ão adianta ontinuar. Ou sair. Olo muito. Mas ele todos os sábados lá estava. Sempre no seu cantinho. Sempre pulando e gruindo a sua moda. Nos oitos meses ele não fez a promessa. Os chefes da Alcatéia se reunião, discutiam e chegavam à conclusão que era perigoso. Ele nunca aprendeu as provas. Não sei. Se fosse eu ele teria feito a promessa dentro dos três meses. Ninguém disse, mas Jovelino desistiu mais não porque riam dele, faziam chacota e sim porque sonhava em vestir o uniforme e não deixaram.

                  Um sábado Jovelino Troca Letras não apareceu. Em principio ninguém notou. As atividades na Alcatéia e na tropa sempre foram intensas e o tempo absorvido com as brincadeiras, com as histórias e com o adestramento. Só no terceiro sábado é que a lobinha Martinha deu falta dele. Perguntaram a todos se ele tinha ido à escola. Ninguém o tinha visto. Marcia ficou preocupada. Afinal ela sentia que não agira muito bem. Não procurou ler, pesquisar e se informar melhor sobre como ajudá-lo. Resolveu ir a casa dele naquele sábado mesmo. Com sua filha que era Escoteira lá foram as duas na Rua do Ouvidor. Não sabiam o número. Natyelle foi quem descobriu. Viu um menino que era da escola e ele mostrou onde era a casa de Jovelino. Na porta a mãe a recebeu com um sorriso triste. Estranharam.

                 Entraram, a mãe de Jovelino serviu um cafezinho e uns bolinhos de fubá que a avó dele fez. Esqueci-me de dizer. Ele ficava o dia inteiro com a Avó enquanto sua mãe trabalhava. – Chefe, fui obrigada a internar o Jovelino em uma casa de repouso que lhe disseram poder ajudar ao seu filho. Ele passou a gritar, chorar, e dizia na sua maneira inteligível que queria morrer. Pessoas humildes, sem posse e conhecimento Marcia se preocupou. Que casa seria esta? Nunca ouviu falar. Pediu o endereço e foi lá. Coitado do Jovelino. No meio de homens e mulheres que estavam em processo de loucura totalmente insana e degradante e se fossem mais olhados pelos familiares não estariam ali mais. Espalhados pelo pátio faziam suas necessidades na grama, pisavam, uns gritavam outros davam gargalhadas. Enfermeiros agiam com brutalidade. Viu Jovelino em um canto, e caramba! Sorrindo! Estava com um buquê de flores e veio correndo entregar a Chefe Marcia. Ela não aguentou. Chorando deu nele um abraço não de Chefe, mas de mãe.

                  Na secretaria disseram que ele não podia sair. Nem a mãe iria poderia tirá-lo. Enquanto não melhorasse. Melhorar? Ali? Marcia foi direto ao juiz da cidade. Conhecia-o. Era pai de um Escoteiro. Jovelino saiu no outro dia. E agora o que fazer? Como reintegrá-lo na Alcatéia novamente? Falar com os lobinhos? Consultou os demais assistentes. Consultou o Diretor Técnico. Fizeram um Conselho de Grupo. Claro, todos se apiedaram de Jovelino e foram unânimes em votar a favor de sua volta. Mas voltar? O que deveriam fazer na Alcateia? Como agir e interagir com os demais? A bomba era da Marcia e seus assistentes.

                  Naquele sábado a reunião seria feita n Praça Central da cidade. Era uma maneira de fazer um marketing e ver se arregimentariam outros lobinhos. A Alcatéia tinha passado para a tropa seis deles. E não havia nenhum aguardando chamada. Não se sabe como um homem grande, barbudo, com um revolver na mão chegou gritando para saírem dali. Pegou no colo a lobinha Martinha que os olhos arregalados começou a gritar e pedir socorro. O homem apontava a arma e dizia que a mataria se alguém se aproximasse. A policia chegou logo e fez o cerco. Estavam atrás dele desde que saiu da agencia bancária. Lá dentro tentou fazer um roubo e não conseguindo matou a tiros o gerente que não quis abrir o cofre. Uma calamidade.

                  Um silencio sepulcral no Parque. Os lobinhos e as lobinhas soluçavam e pediam suas mães. Marcia e os assistentes indefesos. Uma dezena de policiais gritando para ele soltar a menina. Ele começou a dar gargalhadas. – dizia – Vou matar! Vou matar! Nunca tive uma filha e vou levar esta junto comigo para o Inferno. Martinha gritava e ele dizia a ela para calar lhe batendo na cabeça com as mãos. Incrível, ninguém acreditou no que via. Jovelino estava sorrindo. Cantando em alto e bom som e dizia a Martinha – Calma minha irmã! Calma. Tudo vai dar certo e foi chegando para perto dos dois. O bandido gritou para ele parar, pois o primeiro tiro seria dele. A policia gritou para Jovelino sair dali.

                 Com grande agilidade Jovelino deu um salto e abraçou o bandido pelo pescoço. Ele sentindo o peso do menino soltou Martinha que saiu correndo e gritando pedindo sua mãe. Com um safanão o bandido jogou Jovelino no chão e atirou. A policia nesta hora crivou o corpo do bandido de balas. Eles caiu ao chão ao lado de Jovelino que sangrava. Levaram Jovelino para o hospital. Ele quase não estava respirando. Internado na UTI ficou lá dois meses. Na porta do hospital uma multidão de lobinhos e escoteiros e seus familiares faziam vigília. Quatro meses depois ele recebeu alta. Milagre! Sua voz voltou! Falava normalmente. A cidade em peso estupefata com o acontecido. Onde ele passava era agora saudado como herói.

                Dois meses depois na mesma praça, o Grupo Escoteiro estava formado. Um pelotão de lobinhos, um de escoteiros e escoteiras, um de Sênior e guias e os garbosos pioneiros. No palanque o Prefeito, o Juiz, o Delegado, o Presidente da Câmara e o Escoteiro Chefe da Região. Foi ele que entregou ao Jovelino a Medalha de Valor ouro. Fez um belo discurso e Jovelino não chorou. Olhou para a medalha. Sorriu, virou para os escoteiros e falando alto disse – Não sou herói. Cumpri meu dever mesmo não sendo um Escoteiro de fato eu era de coração. Espero que me considerem como irmãos. Obrigado. Sei que todos vocês em meu lugar fariam a mesma coisa.

                Uma salva de palmas de toda a população. Gritos e mais gritos da meninada. Os escoteiros em uma estrondosa palma Escoteira saudavam Jovelino. O lobinho herói de Santa Genoveva. Dizem, eu não sei que Jovelino foi escoteiro Liz de Ouro e Escoteiro da Pátria. Acredito. Dizem também que ele se formou em direito. Dizem que hoje é um grande advogado na capital. Dizem também que ele faz questão de participar de um Grupo Escoteiro lá. E ainda dizem que ele ficou conhecido no mundo inteiro. Jovelino Troca Letras, o herói sorriso que ninguém nunca mais esqueceu.   

Não somos super heróis. A partir do momento que enxergarmos nossa vida como a NOSSA VIDA, nunca mais precisaremos provar nada para ninguém.


Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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